O Senado Federal aprovou, em segundo turno, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 66/2023, uma medida que visa redefinir as regras para o pagamento de precatórios federais, estaduais e municipais. A aprovação, ocorrida nesta terça-feira (2), busca primordialmente aliviar a pressão sobre as contas públicas dos entes federativos e auxiliar o governo federal a alcançar suas metas fiscais. Em suma, a PEC representa uma reestruturação significativa na gestão dessas dívidas judiciais, oferecendo um novo panorama para a previsibilidade orçamentária.
Entendendo a Proposta e Seus Impactos Imediatos
Na prática, a PEC 66/2023, que já havia sido aprovada sem alterações na Câmara dos Deputados, retira os precatórios federais do limite das despesas primárias do Executivo, o que ocorrerá a partir de 2026. Além disso, a proposta estabelece limites para o pagamento dessas dívidas por parte de estados e municípios, e igualmente refinancia as obrigações previdenciárias que esses entes possuem com a União. A promulgação da emenda está programada para a próxima terça-feira, dia 9 de dezembro, às 15 horas, marcando a oficialização das novas regras.
Este conjunto de alterações é benéfico, pois confere mais fôlego a estados e municípios. Afinal, a PEC lhes permitirá quitar dívidas judiciais em parcelas menores e com prazos estendidos. Consequentemente, o governo federal também se beneficia, uma vez que a exclusão de parte desses gastos do teto de despesas primárias facilita o cumprimento da meta fiscal. Os precatórios, para contextualizar, são ordens do Poder Judiciário que determinam o pagamento de dívidas definitivas por órgãos públicos, como a União, estados, municípios e autarquias, após o esgotamento de todos os recursos legais.
Para o senador Jaques Wagner (PT-BA), relator da proposta e líder do governo na Casa, a PEC introduz um elemento crucial de previsibilidade para o Executivo. Segundo ele, atualmente o sistema se caracteriza por uma imprevisibilidade total, onde uma sentença judicial impacta diretamente o orçamento. Portanto, em sua essência, a PEC visa programar esses pagamentos, trazendo maior controle e planejamento financeiro.
No entanto, apesar de remover os precatórios das despesas primárias em 2026, o texto estipula que, a partir de 2027, 10% do estoque total de precatórios será anualmente reincorporado às metas fiscais, conforme estabelecido pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).
Mecanismos de Limitação para Estados e Municípios
A PEC estabelece regras claras para os precatórios devidos por estados, Distrito Federal e municípios. Desse modo, o pagamento será limitado com base no estoque de precatórios em atraso de cada ente. Por exemplo, em 1º de janeiro de cada ano, se o valor total em atraso corresponder a até 15% da Receita Corrente Líquida (RCL) do ano anterior, o ente federativo poderá quitar títulos cuja soma represente 1% dessa receita. É importante ressaltar que esses índices se aplicarão inclusive a entes federativos que atualmente não possuem estoque de precatórios em atraso.
Os percentuais de pagamento são projetados para crescer progressivamente. Consequentemente, o limite pode chegar a 5% da RCL se o estoque de precatórios em atraso for superior a 85% da receita. Em todas as situações, o cálculo para determinar o valor do estoque de precatórios incluirá atualização monetária e juros moratórios. Para a correção, o índice a ser fixado será o menor valor entre a taxa Selic, que atualmente está em 15%, e a combinação do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) mais 2%, calculados de forma simples. Portanto, há uma preocupação em balancear a correção monetária com a capacidade de pagamento.
Refinanciamento de Dívidas Previdenciárias
Outro ponto fundamental da proposta é a permissão para que estados, Distrito Federal e municípios regularizem suas dívidas previdenciárias. Isso abrange tanto as obrigações com seus Regimes Próprios de Previdência Social (RPPS) quanto com o Regime Geral de Previdência Social (RGPS). Além disso, a PEC também abre caminho para a regularização das dívidas de Consórcios Públicos Intermunicipais com o RGPS.
O parcelamento das dívidas com o RGPS será realizado em até 300 prestações mensais, com a possibilidade de prorrogação por mais 60. Por conseguinte, a parcela mensal será limitada a 1% da Receita Corrente Líquida (RCL) do ente. A correção e os juros aplicados variarão entre IPCA + 0% a 4%. O relator Jaques Wagner destacou que tanto o prazo de 30 anos quanto o critério para correção e juros são “absolutamente favoráveis” para garantir a saúde fiscal dos entes subnacionais, proporcionando condições realistas para a quitação dessas dívidas.
Créditos Suplementares e Argumentos Divergentes
A PEC igualmente autoriza que créditos suplementares e especiais abertos em 2025 passem a integrar o limite de despesas a partir de 2026. Este trecho, entretanto, gerou controvérsia e a oposição tentou derrubá-lo durante a tramitação.
O senador Rogerio Marinho (PL-RN), líder da oposição, criticou a medida, afirmando que o governo utilizou esse instrumento para inserir um “jabuti” — um item que foge do assunto principal do projeto — do ponto de vista da expansão fiscal. Ele argumentou que essa expansão afetará fortemente a dívida pública, impedirá a queda dos juros e, consequentemente, impactará a atividade econômica de forma geral.
Por outro lado, Jaques Wagner defendeu a medida, explicando que ela concede ao governo espaço fiscal essencial para acomodar precatórios no Orçamento a partir de 2026. Além disso, permite o pagamento de R$ 12 bilhões referentes à licença-maternidade, montante este decorrente de uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). Em 2024, a Suprema Corte declarou inconstitucional a exigência de carência mínima de dez contribuições ao INSS para que trabalhadoras autônomas e seguradas especiais pudessem receber o salário-maternidade. Agora, com apenas uma contribuição, essas trabalhadoras têm acesso ao benefício, equiparando-se às trabalhadoras formais.
Em conclusão, a aprovação da PEC 66/2023 representa uma reforma abrangente nas regras de precatórios e na gestão da dívida pública, prometendo maior previsibilidade e alívio financeiro para os diversos níveis de governo, apesar dos pontos de divergência entre governo e oposição.