De 5.546 médicos em abril de 2014, chegamos a setembro deste ano com 4.164. As condições de trabalho se deterioraram, a carga de trabalho aumentou, os salários pioraram e a violência se tornou rotina nas unidades de saúde. Hoje, a população já não está encontrando médicos em diversas unidades de saúde e vários serviços estão sendo fechados.
Pacientes e acompanhantes fazem uma peregrinação para encontrar atendimento. Todos os dias as emergências dos hospitais limitam o atendimento porque estão lotadas. Quando não é isso, o atendimento não é feito simplesmente porque não há profissionais. Exemplo disso são a pediatria do Hospital de Planaltina e a Clínica Médica do Hospital do Gama.
A condição de saúde dos pacientes, com tanta demora, acaba se agravando e o governo deixa isso acontecer. Só quando os problemas se tornam insustentáveis, inventam um mutirão, uma tenda ou outro improviso que só resolve o momento. Depois começa tudo de novo. Os médicos que insistem em trabalhar no SUS ficam de mãos amarradas, porque a solução depende de políticas públicas que o governo tem que adotar.
A direção do Sindicato dos Médicos do Distrito Federal já discutiu a situação e apresentou uma proposta de reformulação do plano de carreira, cargos e salários à secretária de Saúde Lucilene Florêncio e à vice-governadora Celina Leão. A instituição também já tentou a intermediação do Ministério Público do Trabalho. O objetivo é evitar que mais médicos saiam do serviço público e que novas contratações possam voltar a ser feitas. Mas não houve resposta aos cinco pedidos de audiência feitos pelo sindicato ao governador. O primeiro foi ainda em 2019 e o último, em agosto deste ano.
“Preferíamos não chegar à greve e tentamos o caminho do diálogo, mas não resta outro recurso. Não é só a situação de trabalho do médico que está ruim, é o próprio SUS que está desmoronando no DF”
afirma o presidente do SindMédico-DF, Gutemberg Fialho.
O colapso do SUS no DF já começou e está se alastrando
Em algumas unidades de saúde o colapso já está acontecendo. Quando decretou a intervenção no Instituto de Cardiologia e Transplantes do Distrito Federal (ICTDF), o governo revelou que as unidades públicas de saúde deixaram de fazer cirurgias cardíacas, por falta de profissionais. “É dramático e não é um caso isolado. Pacientes estão ficando desassistidos em muitas outras áreas e os médicos estão adoecendo em serviço ou se desligando do SUS”, afirma o presidente do Sindicato dos Médicos do Distrito Federal, Gutemberg Fialho.
No Hospital São Vicente de Paulo, serviços ambulatoriais, como o acompanhamento de pacientes autistas, estão sendo desativados. Sem capacidade de atender à demanda, o Centro de Orientação Médico-Psicopedagógica, o COMPP, está encaminhando crianças para o Adolescentro, que já tem sobrecarga de atendimentos. A demora é de meses e até anos para o paciente conseguir o atendimento.
No Hospital Materno Infantil de Brasília (Hmib) acontece a mesma coisa. Lá, já existe um déficit de 22 neonatologistas e 10 outros devem se aposentar este ano. O déficit, que já é de quase 50%, em breve vai chegar a 70%.
No Hospital Regional da Asa Norte, antes do início da pandemia, toda semana havia um dia inteiro para realização de cirurgia de correção de fissuras labiopalatinas. Atualmente, elas só são feitas em um turno, apenas duas vezes por mês. De 16 passaram a ser realizadas só quatro cirurgias mensais.
No Hospital Regional do Gama, o serviço de emergência pediátrica já não funciona há anos e o pronto-socorro de clínica médica, apesar das denúncias feitas desde 2021, não tem capacidade para atender pacientes. Dos médicos contratados ao longo dos anos, quase nenhum ficou, porque as condições de trabalho eram inóspitas.
No Hospital Regional de Planaltina, a equipe de pediatras, que deveria ter 52 médicos, contava com apenas 15 desses especialistas. Quatro médicas da equipe são gestantes – uma já em licença e outras três que logo terão que se afastar do atendimento. Duas delas cogitam se demitir após a licença maternidade. Outros pensam em antecipar a aposentadoria ou a demissão, caso o GDF não tome providências para reverter o caos em que está lançada a assistência pública à saúde no DF.
Contratação de médicos concursados para fortalecer o SUS
Este cenário caótico não é resultado apenas da falta de planejamento, da desorganização logística e da inexistência de uma política de gestão de recursos humanos. São resultado também das escolhas do GDF que enfraquecem o papel do SUS. Prejudicam e desestimulam os médicos que optaram pela função pública, com graves reflexos nas vidas dos pacientes: unidades de saúde superlotadas, demora no atendimento, filas intermináveis para realização de consultas, exames, cirurgias e tratamentos, inclusive aqueles que precisam de acompanhamento continuado. Além, é claro, da queda na qualidade da assistência que é prestada, agravamento de quadros de doença e, não raro, mortes que poderiam e deveriam ser evitadas.
“O primeiro passo para começar a recuperar o SUS no DF é a contratação de profissionais. No caso dos médicos, é necessário reformular o plano de carreira, cargos e salários, para que eles entrem e permaneçam na função pública”, destaca o presidente do SindMédico-DF. As condições orçamentárias para reerguer o SUS no DF existem e a quantidade de médicos disponíveis no mercado de trabalho do DF é grande. “Temos a melhor proporção de médicos por habitante de todo o Brasil. São mais de 19 mil médicos em Brasília, enquanto o GDF só contratou 4 mil. Está nas mãos do GDF fazer o resgate do sistema de saúde. Nós, médicos, continuamos abertos ao diálogo e a ajudar a fortalecer o SUS n DF ”,
afirma Dr. Gutemberg