O Brasil registrou uma redução significativa no trabalho infantil ao longo de oito anos, conforme dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Entre 2016 e 2024, o número de crianças e adolescentes envolvidos em atividades laborais caiu 21,4%, totalizando 1,65 milhão de pessoas na última pesquisa. Em 2016, por outro lado, o contingente era de 2,1 milhões na faixa etária de 5 a 17 anos.
Adicionalmente, a proporção de crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil também diminuiu. Em 2016, 5,2% dos 40,6 milhões de jovens brasileiros entre 5 e 17 anos estavam nessa condição. Em 2024, esta taxa recuou para 4,3% dos 37,9 milhões de indivíduos no mesmo grupo etário. Essas informações provêm de uma edição especial da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua, cuja série histórica teve início em 2016.
Análise da Tendência e Recentes Oscilações
Embora a tendência de longo prazo seja de queda, a comparação entre os dois últimos anos da pesquisa revela uma leve oscilação. O número de pessoas em trabalho infantil cresceu 2,1% de 2023 para 2024, passando de 1,616 milhão para 1,65 milhão. Consequentemente, o percentual da população nessa situação subiu 0,1 ponto percentual no período mais recente.
Gustavo Geaquinto Fontes, analista do IBGE, contextualiza este aumento. Ele considera que a variação de 2,1% “não foi muito acentuada”, sugerindo que o patamar de trabalho infantil no país ainda permanece em um nível relativamente baixo. Fontes lembra, por exemplo, que 2023 marcou o menor resultado histórico, apresentando uma queda de 14,7% em relação a 2022. Diante disso, o analista enfatiza que “permanece certa tendência de queda”, embora seja prematuro afirmar se a recente elevação de 0,1 ponto percentual representa uma reversão definitiva da tendência observada.
Ainda assim, o aumento no último ano concentrou-se principalmente na faixa etária de 16 a 17 anos e entre os homens. Para as crianças mais novas, a situação permaneceu próxima à estabilidade. Ao longo dos oito anos da pesquisa, o percentual de trabalho infantil demonstrou uma trajetória de declínio até 2019. Vale ressaltar que, devido à pandemia de covid-19, a pesquisa não foi realizada nos anos de 2020 e 2021. Em 2022, o percentual registrou um crescimento antes de voltar a cair em 2023 e apresentar a ligeira alta em 2024.
O Que Caracteriza o Trabalho Infantil no Brasil
Para definir o trabalho infantil, o IBGE adota as diretrizes da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Sob essa perspectiva, trabalho infantil é conceituado como toda atividade que se mostra perigosa ou prejudicial à saúde e ao desenvolvimento mental, físico, social ou moral das crianças. Além disso, a classificação inclui qualquer forma de trabalho que interfira na sua escolarização. Acrescentam-se a esta definição as atividades informais e aquelas com jornadas excessivas, que comprometem o bem-estar e o futuro dos jovens.
Portanto, é fundamental compreender que nem todas as atividades laborais realizadas por crianças e adolescentes são categorizadas como trabalho infantil. A legislação brasileira estabelece critérios claros e delimitações específicas para cada faixa etária:
- Para crianças de até 13 anos, é proibida qualquer modalidade de trabalho.
- Adolescentes com idades entre 14 e 15 anos têm permissão para trabalhar exclusivamente na condição de aprendizes.
- Jovens de 16 e 17 anos enfrentam restrições, não podendo atuar em trabalhos sem carteira assinada, atividades noturnas, insalubres ou perigosas.
Remuneração e Ramos de Atividades Envolvidos
A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios também investigou o aspecto econômico do trabalho infantil, revelando que a remuneração média mensal para as crianças e adolescentes nessa condição era de R$ 845. No que se refere à jornada, os pesquisadores constataram que a maioria, ou seja, 41,1%, dedicava até 14 horas semanais às atividades. Por outro lado, 24,2% trabalhavam de 15 a 24 horas, enquanto 18% cumpriam jornadas de 25 a 39 horas. Alarmantemente, 11,6% gastavam 40 horas ou mais em suas ocupações, e estes, curiosamente, apresentavam a maior remuneração média, alcançando R$ 1.259.
Ao analisar os ramos de atividades que mais empregam a mão de obra infantil, o IBGE identificou os seguintes setores, por ordem de participação:
- Comércio, reparação de veículos automotores e motocicletas: 30,2%
- Agricultura, pecuária, produção florestal, pesca e aquicultura: 19,2%
- Alojamento e alimentação: 11,6%
- Indústria geral: 9,3%
- Serviços domésticos: 7,1%
- Outras atividades: 22,7%
Perfil Demográfico e Desigualdades
A pesquisa classifica os resultados em três faixas etárias, e nela, evidencia-se que mais da metade (55,5%) do trabalho infantil se concentra entre adolescentes de 16 e 17 anos. Enquanto isso, as faixas de 5 a 13 anos e de 14 a 15 anos representam, individualmente, cerca de 22% do total. Especificamente no grupo de 16 e 17 anos, o percentual em situação de trabalho infantil passou de 14,7% em 2023 para 15,3% em 2024. Anteriormente, em 2022, esse percentual era de 16,4%.
Pretos e Pardos e a Questão de Gênero
Assim como em outros indicadores socioeconômicos do Brasil, a população preta ou parda enfrenta condições mais desfavoráveis em comparação à população branca. Enquanto 59,7% da população de 5 a 17 anos é preta ou parda, essa parcela representa dois terços (66,6%) do universo do trabalho infantil. Em contraste, os brancos, que constituem 39,4% da população jovem, correspondem a 32,8% das crianças e adolescentes em trabalho infantil.
Os dados também revelam que o trabalho infantil abrange mais homens do que mulheres. Apesar de representarem 51,2% da população total de 5 a 17 anos, os homens somam 66% das pessoas em situação de trabalho infantil, evidenciando uma disparidade de gênero nesse contexto.
Desigualdades Regionais
A análise regional da pesquisa também aponta para desigualdades marcantes. O Sudeste se destaca como a única região com um percentual de trabalho infantil inferior à média nacional de 4,3%. As outras regiões apresentam taxas mais elevadas:
- Norte: 6,2%
- Nordeste: 5%
- Sudeste: 3,3%
- Sul: 4,4%
- Centro-Oeste: 4,9%
A Diferença entre Trabalho Infantil e Tarefas Domésticas
Em paralelo à investigação sobre trabalho infantil, os pesquisadores da PNAD aproveitaram a oportunidade para coletar informações sobre as atividades domésticas realizadas por crianças e adolescentes, que incluem afazeres como lavar louça, preparar refeições, limpar a casa, fazer compras e cuidar de outras pessoas. Em 2024, pouco mais da metade da população de 37,9 milhões de crianças e adolescentes de 5 a 17 anos no Brasil, ou seja, 54,1% (20,5 milhões de pessoas), realiza algum tipo de tarefa doméstica.
A grande maioria desses jovens, cerca de 89,8%, dedicava até 14 horas por semana a essas atividades. Entretanto, diferentemente do cenário do trabalho infantil, onde os homens são maioria, nas atividades domésticas as mulheres predominam. A pesquisa indicou que 58,2% das meninas realizam afazeres domésticos, em comparação com 50,2% dos meninos que também participam dessas tarefas, sublinhando uma divisão de gênero distinta no ambiente familiar.



