O Supremo Tribunal Federal (STF) tem em sua pauta semanal pelo menos três julgamentos de profundo impacto fiscal, cruciais para as finanças governamentais. Estas decisões ocorrem em um momento estratégico, pois o governo busca novas fontes de receita para equilibrar suas contas após o Congresso ter rejeitado medidas arrecadatórias anteriores. Os temas incluem a isenção fiscal de agrotóxicos, a regulamentação do imposto sobre grandes fortunas e a constitucionalidade da prorrogação da desoneração da folha de pagamento.
Supremo Reavalia Isenções Fiscais para Agrotóxicos
Nesta quarta-feira (22), os ministros do STF iniciarão a votação de duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs 5553 e 7755), propostas pelo PSOL e pelo PV. Estas ações questionam a isenção fiscal mínima de 60% concedida aos agrotóxicos, um benefício estabelecido em 1997 pelo Convênio nº 100 do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz). Além disso, os partidos alegam que a norma original permitia aos estados oferecerem isenção fiscal total para esses produtos.
Posteriormente, o Congresso Nacional incorporou essa medida à Constituição por meio da Emenda Constitucional (EC) 132, promulgada em 2023. No entanto, as legendas argumentam que tais isenções contradizem o direito constitucional a um meio ambiente equilibrado e à saúde, violando também o princípio da seletividade tributária. Assim, na semana anterior, as sustentações orais sobre o caso foram apresentadas, com destaque para a defesa do PV.
O advogado Lauro Rodrigues, representando o PV, contestou a premissa de que o subsídio fiscal aos agrotóxicos seria vital para a economia nacional. Ele afirmou que a subvenção beneficia um grupo restrito, embora com produção em larga escala, e buscou refutar a tese de que a interrupção desse incentivo levaria ao colapso do Brasil. Por outro lado, o advogado Rodrigo Kaufmann, em nome da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), defendeu a manutenção dos benefícios. Ele advertiu que a revogação das isenções poderia elevar os custos dos alimentos em R$ 16 bilhões e reduzir a produção agrícola do país em 50%, enfatizando que os defensivos agrícolas não são bens de luxo, mas insumos essenciais e prioritários para a produção.
Debate sobre a Taxação de Grandes Fortunas
Para o dia seguinte, quinta-feira (23), o plenário do STF tem agendado o julgamento de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO 55), também apresentada pelo PSOL. Esta ação acusa o Congresso Nacional de negligenciar seu dever constitucional de regulamentar a taxação de grandes fortunas. Desde 1988, o Artigo 153 da Constituição Federal impõe à União a criação de um imposto sobre grandes fortunas, mas sempre “nos termos de lei complementar”, que, até hoje, nunca foi aprovada.
Instado a se manifestar sobre a omissão, o Senado Federal negou qualquer inércia, afirmando que o tema é e tem sido regularmente debatido na Casa, embora nenhuma proposta tenha sido finalmente aprovada. Em petição, o Senado ressaltou que “o Congresso Nacional não está inerte”. A Câmara dos Deputados, por sua vez, informou que um projeto de lei complementar sobre o tema está pronto para ser votado, considerando descabida a intervenção do Judiciário. A tentativa mais recente de tributar os “super ricos” foi vista na reforma do Imposto de Renda proposta pelo governo e aprovada em 1º de outubro pela Câmara, que prevê uma alíquota adicional de até 10% para rendimentos acima de R$ 50 mil mensais ou R$ 600 mil anuais.
Além da atualização do IR, a última vez que o Congresso votou sobre a criação de um novo imposto sobre grandes fortunas, conforme a previsão constitucional, foi em outubro de 2024, quando uma emenda à reforma tributária sobre o tema foi derrotada por 262 votos a 136. É importante destacar que o Supremo Tribunal Federal, não raro, estabelece prazos para que o Congresso cumpra determinações da Constituição de 1988 que ainda não foram implementadas. Por exemplo, na semana passada, os ministros concederam um prazo de 24 meses para os parlamentares aprovarem uma lei que proteja os trabalhadores contra os impactos da automação.
Julgamento da Desoneração da Folha de Pagamento
Nesta semana, o Supremo continua, em plenário virtual, o julgamento sobre a constitucionalidade da lei aprovada pelo Congresso em 2023, que prorrogou a desoneração da folha de pagamentos para determinados setores econômicos. À época, o governo inicialmente tentou derrubar essa medida. Posteriormente, governo e Congresso chegaram a um acordo, resultando na aprovação da Lei 14.973/2024, que estabelece a retirada gradual da desoneração até 2027.
Entretanto, o ministro Cristiano Zanin, relator do tema, decidiu que o julgamento deveria prosseguir, mesmo diante da nova legislação. Seu objetivo, conforme destacou, era permitir que o Supremo estabelecesse parâmetros claros para a aprovação de legislações desse tipo pelo Parlamento. Zanin votou pela inconstitucionalidade da lei de 2023, argumentando que os parlamentares a aprovaram sem a necessária estimativa de impacto financeiro da desoneração e sem a previsão de medidas compensatórias para a perda de arrecadação.
O ministro enfatizou que a Constituição exige a indicação da estimativa de impacto financeiro em propostas legislativas que criam despesas ou promovem renúncia de receita. Zanin explicou que seu voto, mais do que produzir efeitos imediatos, busca conferir “segurança jurídica ao processo legislativo em temas relacionados à gestão orçamentária, firmando as balizas constitucionais”. Apesar de declarar a inconstitucionalidade da lei de 2023, ele evitou declarar sua nulidade, impedindo assim que contribuintes que se beneficiaram de boa-fé fossem prejudicados, dispensando-os de qualquer cobrança ou devolução de valores. Além disso, o ministro salientou que sua análise não incluiu a lei aprovada em 2024, pois esta não era objeto da ação. Ele observou que “essa delimitação quanto ao objeto de julgamento é importante para permitir uma adequada interpretação do conteúdo do presente voto”. Até o momento, apenas o relator proferiu seu voto, e os demais ministros têm até a próxima sexta-feira (24), às 23h59, para votar.