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RJ: Conferência LGBTQIA+ volta após 10 anos para avançar em políticas públicas.

Conferência LGBTQIA+ Rio

Foto: Jorge Badauê/Divulgação

O Rio de Janeiro se tornou, nesta semana, o epicentro de importantes discussões sobre os direitos da população LGBTQIA+, sediando a 4ª Conferência Estadual dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+. Retornando após um hiato de dez anos, o evento, que ocorre entre 6 e 9 de setembro no Centro de Convenções Bolsa Rio, na região central da cidade, visa primordialmente debater e impulsionar o avanço de políticas públicas essenciais para a cidadania e o enfrentamento à discriminação.

O Retorno da Conferência Após Uma Década

Esta edição da conferência representa um marco significativo para a democracia participativa. Precedida por 11 encontros regionais, realizados entre abril e julho deste ano em diversas partes do estado do Rio, o fórum culmina com a reunião de 700 delegados eleitos nesses eventos preparatórios. Além disso, o sucesso da iniciativa fluminense serve de preparação para a Conferência Nacional dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+, que acontecerá posteriormente.

Para Cláudio Nascimento, presidente do Grupo Arco-Íris, a abrangência da participação estadual é notável. “É de enorme potência ter tantas representações de um mesmo estado, em uma conferência estadual”, afirmou em entrevista à Agência Brasil. Ele ressaltou ainda que mais de 80% dos municípios fluminenses estão representados no evento. “Sem nenhuma arrogância, posso dizer que a conferência do estado do Rio de Janeiro hoje é o maior processo de conferência realizado em um estado brasileiro”, complementou Nascimento, destacando que as 11 conferências regionais contaram com a participação de quase 2 mil pessoas. Ademais, o papel dos delegados é crucial, pois eles representam os anseios e as sugestões de políticas públicas aprovadas para suas respectivas cidades, o estado e o governo federal.

Eixos de Debate e Objetivos da Iniciativa

Promovida pelo governo do Estado do Rio de Janeiro, através do Programa Estadual Rio Sem LGBTIfobia, em cooperação técnica com o Grupo Arco-Íris de Cidadania LGBTI+ e a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), a conferência tem como meta principal avaliar as políticas públicas vigentes. Paralelamente, os participantes debaterão e elaborarão diretrizes futuras para planos municipais, estaduais e federais. Essas diretrizes são fundamentadas na promoção dos direitos e da cidadania para a população LGBTQIA+, bem como no robusto enfrentamento à violência e à discriminação.

Os debates programados abrangem uma vasta gama de temas cruciais. Entre eles, destacam-se educação, saúde integral, segurança pública, trabalho e renda, cultura e memória, meio ambiente, assistência social, esporte e lazer, turismo, e acesso à tecnologia e inovação. Todos esses eixos visam aprimorar a qualidade de vida e garantir a dignidade da comunidade LGBTQIA+.

O Impacto da Discriminação e o Hiato das Políticas

Cláudio Nascimento expressou profunda preocupação com os altos índices de discriminação enfrentados pela comunidade. “Não dá para a gente aceitar mais que 80 % da comunidade LGBTI+, no Rio e no Brasil, relatem já ter sofrido algum tipo de discriminação ou de violência em razão da sua identidade de gênero e da sua orientação sexual”, pontuou o presidente. Segundo ele, essa realidade exige uma mudança urgente e significativa. Por outro lado, o líder do Grupo Arco-Íris lamentou o longo intervalo entre as conferências estaduais, cuja primeira edição ocorreu em 2008. Ele descreveu a década de silenciamento do Estado brasileiro em relação às políticas públicas para a comunidade LGBTQIA+ como um “momento muito sério”.

Nascimento manifestou a esperança de que os debates e reflexões da conferência resultem em ações efetivas. Ele enfatizou a importância da colaboração entre a comunidade e os gestores do Rio de Janeiro para a construção do plano estadual de cidadania LGBTQIA+. Adicionalmente, defendeu a criação de planos municipais e a garantia de financiamento para que as cidades possam desenvolver e implementar essas políticas públicas. “É nas cidades que acontece a vida das pessoas. É lá que elas ou são tratadas com dignidade ou são excluídas do processo”, concluiu, sublinhando a importância da esfera local.

A Vanguarda do Rio de Janeiro em Políticas LGBTQIA+

Ernane Alexandre, superintendente de Políticas Públicas LGBTI da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social e Direitos Humanos (SEDSODH), atribuiu a interrupção de dez anos da conferência a fatores políticos. “Tivemos governos que não eram abertos ao diálogo e a nossa pauta LGBT, simples assim”, explicou. Contudo, ele destacou que, apesar desse desafio, o Rio de Janeiro se posiciona à frente de muitos outros estados do país em termos de políticas públicas para a população LGBTQIA+. “Nos outros estados, há uma deficiência ainda. Isso falando do Norte e Nordeste, mas, no Sul e Sudeste, a gente avançou bastante em relação às políticas públicas”, informou Alexandre.

No estado do Rio, as ações para a comunidade têm se expandido para o interior. “Aqui, no Rio de Janeiro, eu vejo, cada vez mais, uma interiorização desse programa. A gente sai da capital e consegue estar, por exemplo, no interior do Rio de Janeiro trabalhando essa política”, afirmou o superintendente. Atualmente, o Programa Rio Sem LGBTIfobia possui 23 unidades espalhadas por diversos municípios fluminenses, atendendo aproximadamente 25 mil pessoas anualmente em áreas como jurídica, serviço social e psicologia. Por conseguinte, esse progresso levou o Rio de Janeiro a ser reconhecido em 2023 pelo projeto de estudo Atena como o estado mais vanguardista em política pública, ocupando o primeiro lugar entre os 26 estados e o Distrito Federal. Ernane Alexandre celebrou o fato de o Rio possuir uma política pública robusta, apoiada pela Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social e Direitos Humanos, e pela atuação do Conselho Estadual LGBT, criado em 2009. “É uma pena, porque eu queria que todos os estados tivessem essa potência que é o Rio de Janeiro hoje”, desabafou.

Desafios Atuais: Empregabilidade e Educação

Apesar dos avanços inegáveis, Ernane Alexandre identificou problemas persistentes que demandam soluções. “A nossa comunidade LGBTQIA+ ainda necessita de um olhar mais apurado em questões de empregabilidade”, pontuou. Além disso, a assistência social é uma área crítica, com muitos indivíduos em situação de rua necessitando de abrigamento, acolhimento e casas de passagem. A educação também exige atenção prioritária, com a necessidade de cotas para pessoas trans nas universidades e o suporte para que a população LGBTQIA+ conclua o ensino médio, facilitando sua inserção no mercado de trabalho. “Avanços, tivemos, mas também precisamos olhar os desafios”, ressaltou Alexandre.

As propostas elaboradas na Conferência Estadual, destinadas a fortalecer a política estadual de cidadania LGBTQIA+, terão um papel crucial. Elas subsidiarão a etapa nacional do evento, que está agendada para ocorrer entre 21 e 25 de outubro, em Brasília, consolidando o impacto das discussões fluminenses em nível federal.

Conexão Nacional e Agenda Cultural do Evento

A programação da conferência inclui diversas manifestações culturais, enriquecendo o diálogo e a celebração da diversidade. Na noite de abertura, às 18h, aberta ao público e com a presença de autoridades e lideranças LGBTQIA+, houve uma apresentação do Coro de Câmara LGBTI do Rio de Janeiro. A ocasião também marcou a inauguração da Feira de Empreendedorismo “Empodera LGBTQIA+”, que conta com 20 expositores e atrações como desfiles de moda sustentável e pocket shows. Para o encerramento da conferência, a cantora lésbica Leila Maria, uma renomada jazzista que acompanha o movimento LGBTQIA+ desde a década de 90, fará uma apresentação especial. Cláudio Nascimento destacou sua relevância: “Uma mulher negra, 50+, reconhecida, que vai encerrar a atividade da conferência”.

Nos dias 7 e 8 de setembro, o público terá a oportunidade de assistir, às 18h30, no Auditório do Paço, à pré-estreia do espetáculo “Siriocra – o show da diversidade”. Protagonizado por pessoas LGBTQIA+, a peça é dividida em três atos — Alegria, Protesto e Esperança — e resulta de um processo criativo coletivo que celebra a arte como instrumento de resistência e afirmação de identidades. “Esse espetáculo narra as trajetórias da comunidade LGBTQIA+ nos últimos 40 anos, nas buscas por direitos, por autoaceitação e por dignidade na sociedade”, revelou Nascimento. Ele descreveu a produção como um show que mescla teatro, música e performance, contando com a participação de 70 atores no palco.

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