O professor Marcelo Ikeda, uma autoridade reconhecida no campo do cinema e audiovisual, defende a implementação urgente da Lei 13.006. Esta legislação, que torna obrigatória a exibição de filmes nacionais em instituições de educação básica em todo o país, é vista por Ikeda como um instrumento vital para cultivar e expandir o público para o cinema brasileiro. A importância desta regulamentação foi intensamente debatida durante um seminário realizado na cidade de Bonito, em Mato Grosso do Sul.
A Urgência da Regulamentação no Cenário Audiovisual
Conforme destacado por Ikeda, a necessidade de regulamentar a Lei 13.006 é tão premente quanto a regulamentação das plataformas de streaming, uma pauta central atualmente defendida por diversos profissionais do setor audiovisual. Além de suas atuações como cineasta, curador e crítico de cinema, Marcelo Ikeda leciona cinema e audiovisual na Universidade Federal do Ceará (UFC).
Durante o seminário intitulado “Cinema, Políticas e Mercado – A Distribuição do Filme Independente no Brasil”, que ocorreu no Festival de Cinema Sul-Americano de Bonito, Ikeda apresentou uma instigante “provocação” à audiência do Cinesur. Ele convidou os presentes a refletirem profundamente sobre a questão do acesso e da formação de público para as produções audiovisuais nacionais.
A Essência da Lei 13.006 e o Papel Estratégico da Escola
Ikeda enfatizou a existência de uma base legal para essa iniciativa. A Lei 13.006, estabelecida em 2014, determina explicitamente a obrigatoriedade da exibição de obras cinematográficas brasileiras nas escolas de educação básica. Entretanto, passados anos desde sua promulgação, a lei permanece sem a devida regulamentação, o que impede sua aplicação efetiva.
Ele explicou que, embora a regulamentação do streaming seja uma pauta fundamental e estratégica para o setor audiovisual, a questão da Lei 13.006 é igualmente crucial. Para Ikeda, garantir que as plataformas de streaming tenham alguma forma de regulação governamental é vital; contudo, a regulamentação da lei que prevê a exibição obrigatória de cinema brasileiro nas escolas é de importância comparável. Em suas palavras, a dimensão da formação de público é absolutamente fundamental.
Para o professor, é imperativo que crianças e adolescentes tenham acesso ao cinema nacional de uma forma mais abrangente. Por conseguinte, esse processo deve ser iniciado e fomentado dentro do ambiente escolar. Ele argumenta que a escola funciona como uma “semente”, um local primordial onde jovens e adolescentes estão em processo de formação, um espaço de cidadania e de acesso ao conhecimento. A escola, portanto, é um ambiente essencial para a formação integral do indivíduo.
Superando Obstáculos: Estrutura e Formação Pedagógica
A regulamentação da Lei 13.006, conforme detalhado por Ikeda, seria decisiva para criar uma estrutura adequada nas escolas, permitindo a exibição eficaz dos filmes. Atualmente, a ausência de regulamentação impede que a lei seja aplicada de fato, pois não há uma estrutura definida que abranja tanto os equipamentos necessários para a projeção quanto o suporte pedagógico.
Ele compreende que as instituições de ensino precisam estar devidamente preparadas para oferecer aos alunos as condições estruturais necessárias para o aprendizado. Não basta simplesmente determinar a exibição de filmes brasileiros; é fundamental que as escolas possuam a infraestrutura adequada, incluindo projetores, acesso facilitado aos filmes e, igualmente importante, as licenças necessárias para a exibição, a fim de respeitar integralmente os direitos autorais.
Além disso, Ikeda salientou que a regulamentação teria um papel crucial na preparação dos educadores. Professores e cineclubistas, com a formação pedagógica adequada, poderiam não apenas exibir os filmes, mas também promover discussões aprofundadas sobre eles. A formação de público, portanto, não se restringe à mera exibição de obras cinematográficas, mas engloba também o debate e a conversa sobre o conteúdo exibido.
Investimento Inteligente e Conexão Comunitária
De acordo com Ikeda, a implementação deste projeto não demandaria um volume expressivo de investimento público. Ele descreve a iniciativa como uma “política de base”. O professor argumenta que não é suficiente focar a formação de público apenas na construção de cinemas em shoppings, embora reconheça a importância do grande mercado. Para verdadeiramente alcançar as pessoas, é necessário investir na formação de base, um processo que, segundo ele, não requer grandes somas de dinheiro, mas sim um trabalho dedicado de ir aos locais, como as escolas.
Ele enfatiza a relevância da conexão entre a escola e a comunidade. Não basta apenas instalar um projetor e organizar sessões de filmes; é imprescindível contar com “multiplicadores locais” e agentes que estabeleçam conexões efetivas com a comunidade. Eles devem ser capazes de atrair as pessoas e promover uma programação que esteja alinhada com as demandas e interesses dos públicos locais.
CineSur: Palco para o Debate Crucial
O Cinesur, festival de cinema que serviu de palco para as reflexões de Ikeda, acontece anualmente na turística cidade de Bonito, em Mato Grosso do Sul, e neste ano segue até o dia 2 de agosto. O evento exibe 63 filmes provenientes de nove países da América do Sul e, adicionalmente, promove uma série de debates, seminários e cursos de formação. Todas as atividades oferecidas pelo CineSur são gratuitas, reforçando seu caráter de acesso e difusão cultural.