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PM confirma execução de jovem em Paraisópolis; policiais são presos

A Polícia Militar confirmou a execução de Igor Oliveira de Moraes Santos, 24, por agentes em Paraisópolis. Dois policiais foram presos por homicídio doloso em SP após operação que deixou mais um morto e cancelou evento na comunidade.
Execução Igor Paraisópolis
Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

A Polícia Militar de São Paulo confirmou a execução de Igor Oliveira de Moraes Santos, de 24 anos, por agentes em Paraisópolis, na zona sul da capital paulista. Dois policiais militares foram detidos em flagrante por homicídio doloso após a operação, que também resultou em uma segunda morte e no cancelamento de um importante evento comunitário de direitos humanos na região.

A Rotina da Violência em Paraisópolis

Os moradores da comunidade de Paraisópolis, situada na zona sul de São Paulo, já se habituaram com a persistente violência policial. Janilton Jesus Brandão de Oliveira, popularmente conhecido como China e vice-presidente da União dos Moradores e do Comércio de Paraisópolis, expressou em entrevista recente à Agência Brasil que essa realidade se tornou tão comum que “nem assusta mais a gente”. Ele criticou severamente mais uma ação da Polícia Militar na comunidade que culminou em duas mortes e deixou um policial ferido. China enfatizou que a população não pode mais se referir a essas ocorrências como “operações”, pois se tornaram eventos “rotineiros”, acusando a polícia de “executar e matar aleatoriamente”. Ademais, ele apontou que o 16º Batalhão, responsável pela área, é conhecido por tais práticas há tempos.

Detalhes da Operação e Controvérsias Iniciais

Segundo informações divulgadas pela Secretaria de Segurança Pública de São Paulo (SSP-SP), a operação policial em Paraisópolis, ocorrida na quinta-feira (10), foi motivada por uma denúncia sobre a presença de indivíduos armados em um ponto de venda de drogas. Ao chegarem ao local, os policiais relataram ter avistado quatro homens com mochilas, que empreenderam fuga e adentraram uma residência. Consequentemente, três desses indivíduos foram presos, enquanto um deles foi morto pelos agentes policiais. Posteriormente, na manhã seguinte, a própria Polícia Militar, em coletiva de imprensa, desmentiu a versão inicial de que a residência se tratava de uma “casa bomba”, como havia sido previamente alegado pela corporação.

A Confirmação da Execução e Prisão dos Policiais

Em um desdobramento crucial, a Polícia Militar confirmou que as imagens captadas pelas câmeras corporais dos agentes evidenciaram a ilegalidade da ação. Os registros demonstraram que Igor Oliveira de Moraes Santos estava rendido no momento em que foi alvejado e morto. De acordo com o coronel Emerson Massera, porta-voz da PM de São Paulo, dois policiais envolvidos foram imediatamente presos em flagrante por homicídio doloso, ou seja, intencional. Massera explicou que a análise das imagens revelou que “não havia nada que justificasse, nesse momento, o disparo por parte da força policial”, levando à imediata prisão dos envolvidos. Entretanto, essa admissão da corporação apenas reforçou a percepção da comunidade de que a polícia havia mentido sobre os fatos iniciais.

A Perspectiva da Comunidade e a Segunda Morte

Para Janilton “China”, a confissão da PM demonstrou a falsidade das narrativas policiais. Ele lamentou a perda de mais uma vida, ressaltando a dor de mais uma mãe que enterrava seu filho. China relatou que a polícia inicialmente havia divulgado à imprensa que invadira uma “casa bomba” onde houve confronto armado, resultando na morte do “suspeito”. Contudo, a comunidade sabia que os jovens haviam fugido por já possuírem passagens, entraram na casa e se renderam, mas um deles foi “escolhido e executado” pela polícia. China afirmou que a verdade só veio à tona devido à grande repercussão do caso, diferentemente de outras situações onde a palavra da comunidade é frequentemente descredibilizada. Além disso, ele expressou indignação com o comportamento dos policiais, que teriam debochado e comemorado o ocorrido, e manifestou desejo de vê-los presos agora.

Pouco depois da morte de Igor, a comunidade de Paraisópolis se mobilizou em protesto, e durante essa manifestação, uma segunda pessoa foi morta. O porta-voz da PM, coronel Massera, informou que este segundo óbito, de um rapaz identificado como Bruno Leite, ocorreu após uma “intensa troca de tiros”. Um sargento da Rota (tropa de elite da PM) ficou ferido no ombro durante o confronto e foi socorrido para o Hospital Albert Einstein, sendo posteriormente transferido para o Hospital das Clínicas, onde se encontrava fora de perigo. Massera acrescentou que Bruno Leite tinha histórico de passagens por tráfico de drogas, furto e roubo, e era egresso do sistema prisional, tendo morrido em confronto com policiais da Rota.

Busca por Direitos Humanos e Evento Cancelado

Diante da escalada da violência, a União de Moradores de Paraisópolis anunciou que se reunirá, já na próxima semana, com diversas entidades de direitos humanos. O objetivo é discutir a crescente violência policial na área e buscar soluções. China reiterou a necessidade de o Estado garantir que a polícia opere dentro da legalidade. Ele enfatizou que ninguém questiona a necessidade de ações ostensivas, mas que a lei não permite a execução de suspeitos rendidos ou a plantação de provas, como drogas, na casa de moradores. “Ninguém tem direito de tirar vida de ninguém”, ele concluiu, em um apelo por justiça e respeito aos direitos fundamentais.

Consequentemente, uma importante ação de direitos humanos que seria realizada neste sábado (12) em Paraisópolis precisou ser cancelada devido ao agravamento da situação de segurança. O evento, intitulado “Direitos em Movimento – Ouvidoria Itinerante”, era uma iniciativa da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos em parceria com a União dos Moradores de Paraisópolis e o Legado Paraisópolis. Contaria com a participação de órgãos como a Receita Federal, o Ministério da Saúde, o Tribunal Regional Eleitoral e o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), visando facilitar a emissão de documentos e a vacinação dos residentes. Uma nota conjunta informou que a decisão de cancelar a atividade, prevista para os dias 12 e 13 de julho, foi tomada “por motivos de força maior”, em razão do “agravamento do contexto de segurança no território, após a atuação da Polícia Militar do Estado de São Paulo, por meio do 16º Batalhão, que resultou na morte de cidadãos e na prisão de dois policiais militares, além do indiciamento de outros dois agentes”.