A Procuradoria-Geral da República (PGR) protocolou um recurso no Supremo Tribunal Federal (STF) com o objetivo de frear uma recente decisão da própria Corte que expandiu o alcance do foro por prerrogativa de função, conhecido popularmente como foro privilegiado. A iniciativa da PGR busca assegurar que processos criminais que já se encontram em estágio avançado permaneçam sob a jurisdição das instâncias inferiores, onde vinham tramitando. Em março deste ano, o STF havia determinado que ações penais contra parlamentares federais poderiam continuar na mais alta Corte, mesmo após o término de seus mandatos.
O Recurso da PGR e a Decisão do STF
O entendimento anterior do Supremo, estabelecido em março de 2025, ampliou significativamente o escopo do foro privilegiado. Conforme essa diretriz, o processo contra um político permanece no STF se o delito em questão foi cometido durante o exercício de suas funções parlamentares. Além disso, a regra se aplica indistintamente a situações de renúncia ao cargo, não reeleição ou cassação do mandato, garantindo a continuidade da tramitação na Corte superior.
Entretanto, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, em manifestação enviada ao STF na última terça-feira, 5 de agosto, defendeu que a aplicação dessa decisão não pode ser automática nem irrestrita a todos os processos. Para Gonet, é crucial que a nova interpretação não retroaja para abarcar ações penais já em suas etapas finais. Dessa forma, tais processos deveriam permanecer sob a competência dos tribunais de primeira e segunda instâncias, evitando uma transferência que poderia ser prejudicial ao andamento da Justiça.
Argumentos da Procuradoria-Geral da República
A principal tese da PGR, articulada por Paulo Gonet, centra-se na preservação da celeridade processual e na garantia do devido processo legal. Segundo o procurador, as investigações criminais que já tiveram sua instrução encerrada, ou seja, que estão na fase de apresentação de alegações finais, devem continuar sob a jurisdição original. A permanência nesses órgãos, conforme a argumentação, assegura um desfecho compatível com as garantias processuais já estabelecidas, evitando interrupções desnecessárias.
Ademais, Gonet manifestou preocupação com o que classificou como “retrocesso investigativo” caso a decisão do STF seja aplicada de maneira indiscriminada. Ele argumenta que a implementação automática e irrestrita da nova orientação poderia, ironicamente, reproduzir os mesmos efeitos negativos que a mudança anterior buscava mitigar. Entre esses efeitos deletérios, o procurador-geral apontou riscos concretos de atrasos nas investigações, morosidade judicial e, consequentemente, ineficácia jurisdicional. Portanto, a PGR busca uma modulação da decisão que preserve a eficiência e a finalidade da justiça.
Apesar do recurso e da clareza dos argumentos apresentados pela Procuradoria-Geral da República, ainda não há uma data definida para o julgamento da matéria pelo Supremo Tribunal Federal. A expectativa é que a Corte analise o pleito e decida sobre a modulação do alcance da ampliação do foro privilegiado.
O Debate Ampliado sobre o Foro Privilegiado e Contexto Político
A discussão em torno do foro por prerrogativa de função ganhou renovado destaque nesta semana, impulsionada por movimentações políticas de parlamentares ligados ao ex-presidente Jair Bolsonaro. Tais articulações visam à aprovação de mudanças nas regras de julgamento do STF, com o objetivo explícito de retirar processos cruciais da trama golpista da alçada da Corte e, assim, impedir o julgamento do próprio ex-presidente. Este cenário demonstra a intersecção entre as decisões judiciais e as estratégias políticas em curso no país.
Para ilustrar a relevância desse debate, vale ressaltar que Jair Bolsonaro figura como um dos réus no núcleo 1 da ação penal que apura a tentativa de golpe de Estado. Esse processo específico já se encontra em sua fase derradeira, aguardando apenas a entrega das alegações finais pelas defesas, procedimento previsto para a próxima semana. Dessa forma, o julgamento do caso de Bolsonaro, com alta probabilidade de ocorrer em setembro, adiciona uma camada de urgência e sensibilidade à discussão sobre o foro privilegiado e sua aplicabilidade.