Redes sociais lucram com discursos de ódio
Um estudo conduzido pelo NetLab, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), revelou que conteúdos misóginos publicados no YouTube não apenas disseminam mensagens de ódio contra mulheres, mas também geram lucros significativos para influenciadores e para a própria plataforma. A pesquisa analisou mais de 76 mil vídeos e identificou 137 canais que promovem discursos que naturalizam e incentivam a violência de gênero, alcançando bilhões de visualizações.
O relatório, divulgado nesta sexta-feira (13), destaca que os criadores desses conteúdos usam estratégias sofisticadas para engajar o público e gerar receita. Além dos ganhos com anúncios veiculados no YouTube, muitos canais utilizam doações, vendas de produtos e serviços, e até mesmo criptomoedas como formas alternativas de monetização.
Estratégias de manipulação e impacto social
A pesquisa revelou que boa parte dos vídeos analisados disfarça mensagens de ódio como “técnicas de sedução” ou conselhos de “desenvolvimento pessoal masculino”. Alguns conteúdos ensinam métodos de manipulação emocional e incentivam o uso de aplicativos para monitorar mulheres. De acordo com o relatório, 15% dos canais analisados justificam ou relativizam a violência contra mulheres, enquanto 66% defendem que o sexo biológico deve determinar o comportamento humano.
“Esses vídeos criam uma demanda pela misoginia enquanto produto comercial”, explicou Marie Santini, diretora do NetLab. Ela ressaltou que a monetização desses conteúdos perpetua um ecossistema autossustentável de ódio e discriminação.
A pesquisa também apontou que a maior parte do conteúdo foi publicada entre 2021 e 2024, coincidindo com o aumento da violência de gênero no Brasil. Vídeos com temáticas antifeministas somaram 62 mil visualizações e frequentemente associam controle feminino a “valores tradicionais”.
Reação do YouTube e regulamentação das redes
Em resposta ao relatório, o YouTube afirmou que todos os conteúdos na plataforma devem obedecer às Diretrizes de Comunidade, que proíbem discursos de ódio e incitação à violência. Segundo a empresa, entre janeiro e setembro de 2024, mais de 511 mil vídeos foram removidos por violarem essas regras. Contudo, o YouTube não comentou diretamente os resultados do estudo, alegando não ter sido consultado durante a pesquisa.
A ministra das Mulheres, Cida Gonçalves, defendeu a regulamentação das redes sociais como medida essencial para conter a disseminação de discursos de ódio. “Precisamos regular ao máximo e fortalecer o debate para enfrentar a violência contra as mulheres. Também queremos dialogar com as plataformas para interromper a monetização de conteúdos prejudiciais”, afirmou.
O desafio da identificação e combate à misoginia
Os pesquisadores do NetLab destacaram que uma das dificuldades no combate à misoginia online é a definição do que constitui este tipo de discurso. Muitas vezes, mensagens de ódio aparecem veladas ou disfarçadas de humor e conselhos. Luciane Belin, coordenadora da pesquisa, enfatizou a necessidade de uma abordagem abrangente. “Tentamos olhar para a misoginia de forma mais ampla, incluindo desde desprezo até a justificação da violência contra mulheres”, explicou.
O relatório sugere a implementação de políticas públicas mais eficazes, o fortalecimento do debate sobre regulamentação e a criação de conteúdos positivos que disputem espaço nas redes sociais. A ministra reforçou que a sociedade deve se unir para combater essa problemática.