Edição Brasília

Peptídeos de Vespa e Nanotecnologia: Nova Esperança para o Tratamento do Autismo

Pesquisadores da UnB, com apoio da FAPDF, exploram moléculas bio-inspiradas na peçonha de vespas para desenvolver novos peptídeos vespa tratamento autismo. Saiba como a nanotecnologia otimiza a entrega cerebral.
Peptídeos de Vespa e Nanotecnologia: Nova Esperança para o Tratamento do Autismo

O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é uma condição complexa do neurodesenvolvimento que afeta a comunicação, interação social e resulta em padrões restritos de interesse. Embora o diagnóstico e as intervenções comportamentais tenham evoluído significativamente, a medicina ainda carece de um tratamento farmacológico específico que atue diretamente nas raízes neurobiológicas do transtorno. Atualmente, os medicamentos disponíveis apenas amenizam sintomas associados, como ansiedade, agitação e irritabilidade.

Diante dessa lacuna crítica, pesquisadores da Universidade de Brasília (UnB) estão explorando uma fronteira científica surpreendente: as moléculas encontradas na peçonha de vespas sociais. Sob a coordenação da professora Márcia Renata Mortari, do Laboratório de Neurofarmacologia da UnB, o projeto avalia o potencial terapêutico dos neuropeptídeos NeuroVAL e Protonectina-F. Este estudo inovador, viabilizado pelo fomento da Fundação de Apoio à Pesquisa do Distrito Federal (FAPDF), busca transformar compostos naturais em alternativas seguras e eficazes para o tratamento do TEA.

A professora Mortari, que recentemente conquistou o 1º lugar no Prêmio FAPDF (Pesquisador Inovador – Setor Empresarial), explica que o laboratório dedica-se há duas décadas ao estudo de peçonhas de insetos. O objetivo é isolar e modificar estrategicamente esses compostos bio-inspirados para que adquiram propriedades terapêuticas específicas. “Trabalhamos com moléculas bioinspiradas na natureza, mas estrategicamente modificadas para que sejam seguras, seletivas e aplicáveis do ponto de vista terapêutico”, afirma a coordenadora.

Peptídeos de Vespa: Uma Abordagem Multialvo para o TEA

A escolha de investigar os peptídeos vespa tratamento autismo não é aleatória. O TEA não é causado por uma falha em um único mecanismo, mas sim por alterações em múltiplos sistemas de neurotransmissão, incluindo os sistemas GABAérgico, glutamatérgico, opioide e serotoninérgico. Por isso, estratégias terapêuticas que miram apenas um alvo tendem a ter eficácia limitada.

A grande promessa do NeuroVAL e da Protonectina-F reside na sua capacidade de modular simultaneamente esses diferentes sistemas neuroquímicos. O NeuroVAL, desenvolvido no próprio laboratório, já demonstrou um perfil de segurança promissor em modelos de dor, onde apresentou potente efeito analgésico sem efeitos adversos relevantes. Já a Protonectina-F exibe atividade neuroativa ligada ao sistema opioide, crucial para a regulação emocional e o controle da hiperatividade.

A hipótese central da pesquisa é que, ao modular esses sistemas de forma integrada, os peptídeos podem contribuir significativamente para a melhora de comportamentos sociais, a redução da ansiedade e a diminuição de padrões repetitivos, características centrais do autismo.

Nanotecnologia Otimiza a Entrega Cerebral

Um dos maiores obstáculos no desenvolvimento de medicamentos baseados em peptídeos é a sua rápida degradação enzimática no organismo. Para superar essa limitação e garantir que os peptídeos cheguem ao cérebro de forma eficiente e segura, o projeto da UnB integrou a nanotecnologia à sua metodologia.

Os pesquisadores encapsulam os neuropeptídeos em nanossistemas, utilizando materiais como quitosana e partículas lipídicas sólidas. A professora Mortari detalha que “A nanotecnologia permite que as partículas permaneçam aderidas à mucosa nasal por mais tempo, prolongando o efeito terapêutico e aumentando a eficiência da entrega cerebral.” Essa inovação é vital para identificar janelas terapêuticas seguras e para o futuro desenvolvimento de medicamentos.

Os resultados preliminares, obtidos em um modelo animal de TEA induzido por ácido valproico, são altamente animadores. Nos testes comportamentais (como o teste de sociabilidade em três câmaras e o labirinto em cruz elevado), os animais tratados com os peptídeos demonstraram maior interação social, redução de comportamentos repetitivos e níveis de ansiedade significativamente menores em comparação com os grupos não tratados. Estes achados confirmam o potencial terapêutico real dos compostos.

Além dos avanços científicos diretos no TEA, a pesquisa financiada pela FAPDF abriu novas linhas de investigação para outros transtornos neurológicos, como depressão, epilepsia e dor crônica. O grupo de pesquisa já está em contato com a indústria farmacêutica, visando o licenciamento do peptídeo NeuroVAL e a aceleração dos estudos clínicos futuros, consolidando uma linha de pesquisa com forte potencial translacional. O projeto também cumpre um papel fundamental na formação de novos cientistas, envolvendo bolsistas de iniciação científica, mestrado e pós-doutorado na execução experimental e análise de dados.