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Nádia Taquary revela balangandãs como joias de liberdade em SP

Nádia Taquary leva ao Sesc Belenzinho, SP, a exposição "Ònà Irin", revelando a história dos balangandãs como joias de liberdade e poder feminino até 2026.
Exposição Nádia Taquary balangandãs
Foto: Sesc-SP/Divulgação

Nádia Taquary, a renomada artista baiana, traz à capital paulista a exposição “Ònà Irin”, um evento que transcende a mera mostra de joias e se aprofunda na rica história dos balangandãs, revelando-os como poderosos símbolos de liberdade, empoderamento e resistência feminina. Montada no Sesc Belenzinho, a mostra convida o público a uma jornada cultural que se estenderá até fevereiro de 2026, celebrando o sagrado e a força de mulheres que desafiaram sistemas opressores.

A Exposição “Ònà Irin”: Um Mergulho na Cultura Afro-Brasileira

A exposição “Ònà Irin: caminho de ferro” é o resultado de uma meticulosa pesquisa de Nádia Taquary. Ao todo, vinte e duas obras, abrangendo diversas fases e linguagens artísticas da carreira da artista, estão em exibição. Estas peças, que incorporam pingentes com elementos do cristianismo e de religiões de matriz africana, servem como um tributo não apenas ao orixá Ogum, mas também ao feminino e ao legado de força e fé perpetuado por inúmeras mulheres.

Para Taquary, a compreensão dos balangandãs está intrinsecamente ligada ao conceito de “pecúlio”. Historicamente, esse termo designava a possibilidade de pessoas escravizadas acumularem bens e valores para conquistar a tão almejada alforria. Portanto, por meio de doações, legados e heranças, e com a permissão de seus senhores, esses indivíduos podiam formar um montante financeiro para comprar sua liberdade, e em muitos casos, auxiliar outros a mitigar os horrores da escravidão.

Em uma entrevista concedida à Agência Brasil durante o processo de montagem da exposição, a artista enfatizou a profundidade histórica dessas peças. “Não os vejo como meros acessórios; para mim, tudo aqui está conectado à história. Uma penca de balangandãs, que alguém poderia considerar um ornamento, nunca foi isso. Representava uma forma de pecúlio guardado no próprio corpo, um corpo que, mesmo submetido, precisava ser o custodiante de sua própria economia, visto que não existia outra alternativa, como uma conta bancária”, explicou Taquary, ressaltando a engenhosidade e a necessidade por trás desses objetos.

Com o desejo de compartilhar as descobertas de sua pesquisa sobre joalheria afro-brasileira, iniciada em 2010, Taquary materializa a essência do feminino e do divino em instalações diversas, esculturas, videoinstalações e objetos escultóricos. Assim, percorrendo o salão escuro do Sesc, o público encontra elementos luminosos e as figuras de suas “mulheres-pássaros”, que simbolizam, sobretudo, a resiliência e a capacidade de superação de quem enfrentou o inimaginável.

A Profunda História dos Balangandãs

Os balangandãs, conhecidos por diferentes denominações como balançançan, barangandãs, belenguendén e berenguendén – termos que ecoam sonoridades africanas e onomatopeias –, eram frequentemente confeccionados em ouro e prata. Além disso, essas joias estavam inegavelmente atreladas ao contexto da escravidão no Brasil Colônia, uma possessão ultramarina portuguesa, refletindo as complexas interações culturais e sociais da época.

A conexão de Nádia Taquary com os balangandãs é também profundamente pessoal. A artista revelou que, na infância, seu pai lhe presenteou com um balangandã que havia pertencido à sua bisavó, avó e mãe. Posteriormente, já na fase adulta e após uma visita reveladora ao Museu Carlos e Margarida Costa Pinto, na Bahia, Taquary, filha de mãe branca e pai preto, compreendeu a poderosa mensagem de tradição iorubá que essa peça ancestral carregava. Essa epifania marcou o início de uma imersão ainda maior na cultura e história afro-brasileira.

Nesse sentido, a artista comentou sobre essa revelação: “Pude adentrar essa história, e a partir dela, tudo se tornou uma continuidade sobre a presença feminina, o protagonismo que une para libertar. Diante de uma sociedade escravocrata e sexista, essas mulheres ascendem dentro de um sistema completamente desfavorável”, destacou, sublinhando o papel fundamental das mulheres negras na luta por emancipação e reconhecimento.

Protagonismo Negro na Joalheria: Estética e Identidade

É importante mencionar que, simultaneamente à exposição no Sesc Belenzinho, Nádia Taquary também apresenta sua obra “Ìrókó: Árvore Cósmica” na 36ª Bienal de São Paulo, no Pavilhão da Bienal, localizado no Parque Ibirapuera. Este trabalho reforça sua presença significativa no cenário artístico contemporâneo.

Apesar de incorporar diversos elementos como tela, aquarela e barro em algumas de suas criações, Taquary mantém-se fiel à sua premissa artística central. Consequentemente, ela enfatiza que “o protagonismo preto na joalheria afro-brasileira está plenamente representado na exposição”, reiterando a importância de visibilizar essa narrativa.

Ademais, a artista detalha a inspiração por trás de sua joalheria: “No caso de toda a joalheria da minha obra, ela vem muito com uma referência de opulência, dessa estética ostentatória da joalheria africana, especialmente do povo Akan, que habita regiões como Costa do Marfim, Togo e Gana. No Brasil Colônia, por outro lado, era proibido chamar a atenção do colo para baixo; as pessoas usavam apenas um camafeu, um anel, brincos e um pente. Contudo, percebemos que nessa joalheria havia uma busca por identidade, uma outra necessidade de se posicionar dentro dessa estética”, elucidou Taquary, comparando as práticas e os significados da joalheria em diferentes contextos históricos e culturais.

Serviço e Informações

Ònà Irin: caminho de ferro, de Nádia Taquary

Local: Sesc Belenzinho – Rua Padre Adelino, 1000. Belenzinho – São Paulo

Período: Até 22 de fevereiro de 2026

Horários: De terça a sábado, das 10h às 21h. Domingos e feriados, das 10h às 18h

Acessibilidade: Rampas, elevadores, pisos táteis, banheiros adaptados e outros equipamentos acessíveis.

Classificação indicativa: livre

Entrada: Gratuita

Telefone: (11) 2076-9700

Website: sescsp.org.br/Belenzinho

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