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MAR celebra Vinicius de Moraes com 300 itens e retrato inédito de Portinari

O Museu de Arte do Rio (MAR) homenageia os 112 anos de Vinicius de Moraes com mostra de 300 itens. Um retrato inédito, pintado por Portinari, é o grande destaque.
Exposição Vinicius de Moraes MAR
Foto: Acervo Digital Vinicius de Moraes/Direitos reservados

O Museu de Arte do Rio (MAR) celebra, neste mês, os 112 anos do nascimento de Marcus Vinicius da Cruz de Melo Moraes, mais conhecido como Vinicius de Moraes, com uma grandiosa exposição. A mostra, intitulada “Vinicius de Moraes: Por Toda a Minha Vida”, reúne mais de 300 itens que mergulham na trajetória do poeta, diplomata e compositor. Entre os destaques da coleção está um retrato inédito do artista, pintado por Cândido Portinari, que é exibido pela primeira vez no Rio de Janeiro, cativando os visitantes com uma nova perspectiva sobre o “Poetinha”.

O Rio como Cenário Permanente e Inspiração

Nascido no Rio de Janeiro em 19 de outubro de 1913, Vinicius de Moraes estabeleceu uma profunda conexão com a cidade que se tornaria o pano de fundo constante de sua poesia, canções e vida pessoal. Desde a infância vivida na Gávea até as icônicas noites em Ipanema, o Rio de Janeiro transcendeu a mera paisagem; ele se transformou em personagem, musa e espelho de suas criações. Assim, a exposição no MAR não apenas revisita a obra de Vinicius, mas também ressalta essa simbiose intrínseca com a Cidade Maravilhosa, um tema recorrente em seu vasto repertório.

A mostra, aliás, não se limita apenas a documentos e fotografias. Com mais de trezentos itens, entre os quais manuscritos, vídeos, livros e diversas obras de arte, a curadoria proporciona uma imersão completa na vida e no processo criativo de um dos pilares da cultura brasileira. Além do retrato de Portinari, os visitantes podem apreciar um espaço dedicado exclusivamente a “A Arca de Noé”, com as marcantes ilustrações de Elifas Andreato, que continuam a encantar crianças e adultos desde a sua publicação original na década de 1970.

Trajetória Versátil: Do Direito à Diplomacia e Arte

Vinicius de Moraes demonstrou talento precoce. Aos nove anos, em uma época em que São Paulo fervilhava com a Semana de Arte de 1922, ele já esboçava seus primeiros versos. Ainda na juventude, enquanto estudante do Colégio Santo Inácio, formou um grupo musical com amigos, incluindo os irmãos Paulo e Haroldo Tapajós, com quem assinou a letra de sua primeira canção gravada, “Loira ou Morena”, em 1932. Posteriormente, em 1933, publicou seu primeiro livro de poemas, “O Caminho para a Distância”, obra que chamou a atenção de figuras ilustres como Manuel Bandeira e Mário de Andrade, que reconheceram nele uma voz nova e promissora na literatura brasileira.

Apesar de ter concluído a graduação em Direito, Vinicius optou por seguir seu verdadeiro chamado: transformar a experiência humana em palavra e música. Sua carreira foi notavelmente multifacetada. Ele atuou como diplomata, jornalista, crítico de cinema, dramaturgo, letrista e, ainda, cantor. Serviu no Itamaraty de 1946 a 1968, até ser aposentado compulsoriamente durante o regime militar. Contudo, a perda de sua função diplomática abriu portas para uma nova e prolífica fase artística, período em que intensificou suas colaborações musicais.

Parcerias Marcantes e o Legado Musical

Foi precisamente nas parcerias musicais que o poeta encontrou sua expressão mais popular e, por conseguinte, mais universal. Ao lado de Tom Jobim, Vinicius de Moraes ajudou a dar forma à Bossa Nova, gênero que eternizou o imaginário solar do Rio de Janeiro dos anos 1950. Além disso, a união artística com Toquinho resultou em uma das duplas mais queridas da música brasileira, que produziu mais de cem canções e realizou aproximadamente mil apresentações pelo mundo. Essas colaborações não apenas solidificaram seu papel na música, mas também expandiram sua influência cultural.

De acordo com dados do Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad), o legado musical de Vinicius de Moraes é imenso, ultrapassando 700 obras musicais, com 709 composições e 527 gravações registradas. Sua vasta obra percorre temas tão diversos quanto o amor e a infância, a fé e a boemia, o lirismo e a ironia, demonstrando uma capacidade ímpar de tocar a alma brasileira. Posteriormente, suas canções e poemas continuam a ser interpretados por diferentes gerações de artistas, perpetuando sua relevância.

Entre Versos e Peças Teatrais: A Profundidade Literária

No campo literário, Vinicius também deixou uma marca indelével. Entre seus livros mais notáveis estão “Forma e Exegese” (1935), “Poemas, Sonetos e Baladas” (1946), “Livro de Sonetos” (1957) e “A Arca de Noé” (1970), que se tornou um clássico da literatura infantil. Entretanto, sua contribuição para o teatro é igualmente significativa. A peça “Orfeu da Conceição” (1954), descrita como “uma tragédia carioca”, transportou o mito grego para o cenário das favelas do Rio de Janeiro e serviu de inspiração para o aclamado filme “Orfeu Negro”, vencedor da Palma de Ouro em Cannes em 1959. Esta obra, em particular, ilustra sua capacidade de universalizar temas locais.

O escritor Ruy Castro, autor da biografia da Bossa Nova “Chega de Saudade”, frequentemente ressalta a pluralidade de Vinicius, observando que sua multifacetada atuação era de fato impressionante e difícil de ser igualada. Da mesma forma, o biógrafo José Castello, em sua obra “Vinicius de Moraes – O Poeta da Paixão” (1994), descreve o “Soneto de Fidelidade” como uma das mais belas definições do amor já produzidas em língua portuguesa, sublinhando a maestria poética do autor. Ainda assim, mesmo entre os maiores nomes da poesia brasileira, Vinicius ocupa um lugar singular, conforme destacou Carlos Drummond de Andrade. Drummond afirmou que o Poetinha “tem o fôlego dos românticos, a espiritualidade dos simbolistas, a perícia dos parnasianos e o cinismo dos modernos”, uma síntese que celebra a riqueza e a amplitude de sua obra.

Vinicius de Moraes faleceu em 9 de julho de 1980, aos 66 anos, vítima de edema pulmonar, deixando um legado imaterial que continua a inspirar e emocionar gerações, tanto no Brasil quanto no exterior. Sua vida e obra são um testemunho da capacidade humana de transcender fronteiras artísticas e emocionais.