Após anos de intensa degradação, os manguezais da Baía de Guanabara, no Rio de Janeiro, exibem notáveis sinais de recuperação ambiental. Por meio de um ambicioso projeto de reflorestamento, a Área de Proteção Ambiental (APA) de Guapi-Mirim, situada na região metropolitana carioca, registrou o retorno de 62 espécies de animais, incluindo aves, crustáceos e mamíferos. Esse expressivo aumento na biodiversidade indica um reequilíbrio ecológico em curso, revitalizando um ecossistema vital para a região.
A Regeneração da Baía de Guanabara
Diversas espécies que outrora haviam abandonado o habitat natural dos mangues estão, consequentemente, retornando à APA de Guapi-Mirim. Caranguejos, aranhas e borboletas, por exemplo, sentem-se novamente acolhidos em um ambiente que agora demonstra vigor e resiliência. Essa transformação positiva é resultado direto do esforço contínuo do Projeto Uçá, uma iniciativa da ONG Guardiões do Mar em parceria com a Petrobras, através do Programa Petrobras Socioambiental.
Desde 2022, o Projeto Uçá tem sido o principal responsável pela restauração ativa desses ecossistemas. Além disso, a equipe monitora meticulosamente dados cruciais sobre a biodiversidade local, a qualidade do solo e da água. O retorno da fauna, conforme explicam os organizadores, é um indicador inequívoco do aumento da diversidade biológica e, em última análise, do restabelecimento do equilíbrio ambiental na área.
Biodiversidade em Crescimento e Espécies-Chave
O reflorestamento desempenhou um papel determinante no acolhimento de várias espécies. O caranguejo marinheiro, por exemplo, depende da estrutura das árvores para sua locomoção e, portanto, sua presença massiva atesta a maturação do manguezal. Analogamente, o reaparecimento das borboletas ocorreu concomitantemente ao crescimento significativo dos mangues. As aranhas, por sua vez, exercem um controle natural de pragas, um serviço ecossistêmico essencial para a saúde do ambiente.
Ademais, outras criaturas têm sido avistadas com maior regularidade nas áreas regeneradas. Entre elas, destacam-se capivaras, tamanduás-mirins, quatis, diversas espécies de garças e o emblemático caranguejo-uçá. Até o momento, o monitoramento confirmou o registro de um total de 62 espécies, abrangendo aves, mamíferos e crustáceos, em todas as áreas que passaram pelo processo de reflorestamento. Espécies no topo da cadeia alimentar, como a garça-azul, a garça-grande-branca e o mamífero mão-pelada, também foram observadas, consolidando a complexidade e vitalidade do ecossistema restaurado.
A campanha de reflorestamento, iniciada entre 2015 e 2016, já demonstra resultados consistentes. Conforme dados do Projeto Uçá, as árvores plantadas atingiram uma altura expressiva, variando entre 8 e 10 metros. Essa altura é considerada ideal, constituindo-se em um forte indício de um reflorestamento bem-sucedido e da capacidade de regeneração do bioma.
Monitoramento da Avifauna: Um Pilar da Recuperação
O acompanhamento rigoroso das aves pelo Projeto Uçá constitui um dos pilares técnicos fundamentais para a medição da recuperação ambiental da Baía de Guanabara. Para tanto, são realizados registros fotográficos e auditivos, utilizando-se ferramentas modernas como os aplicativos Merlin e WikiAves. Em acréscimo, câmeras equipadas com lentes teleobjetivas garantem registros mais precisos e detalhados das diversas espécies presentes.
Os pesquisadores estimam que o retorno das aves foi diretamente condicionado ao crescimento da vegetação dos mangues, que precisou alcançar uma altura mínima de 3 metros para atrair essas espécies. Um exemplo notável dessa correlação foi o registro, considerado raro, da figuinha-do-mangue, uma ave que figura na lista de espécies ameaçadas de extinção. Essa descoberta sublinha a importância da restauração do habitat para a sobrevivência de espécies vulneráveis.
Posteriormente, o projeto celebrou outras aparições significativas. Incluem-se os registros da Batuíra-de-bando (Charadrius semipalmatus), uma espécie migratória oriunda do Hemisfério Norte, e do Periquitão (Psittacara leucophthalmus), além do Carrapateiro (Milvago chimachima). As duas últimas, aliás, são espécies que enfrentam riscos de caça e tráfico ilegal, tornando seus registros na área restaurada ainda mais importantes para a conservação.
Saberes Tradicionais e o Fortalecimento Comunitário
No processo de restauração, o Projeto Uçá incorporou metodologias inovadoras que se baseiam nos saberes e conhecimentos tradicionais das comunidades locais. Ao invés de priorizar a produção de mudas em viveiros, a iniciativa adotou uma técnica de transplantio direto. Essa abordagem consiste em retirar mudas jovens de plantas-mãe e replantá-las imediatamente no campo, um método que comprovadamente reduziu as perdas para menos de 6%, demonstrando sua alta eficácia e adaptabilidade às condições locais.
Conforme destacou Pedro Belga, presidente da ONG Guardiões do Mar, o projeto transcende a dimensão puramente ecológica ao fomentar também o desenvolvimento econômico local. Por exemplo, a revitalização dos manguezais possibilitou um aumento na captura de caranguejos, atividade que representa a principal fonte de sustento para inúmeras famílias da região. Nesse contexto, Belga enfatizou a crucial importância da participação ativa das comunidades tradicionais e do empoderamento dos residentes das áreas impactadas, pois, segundo ele, são esses os maiores defensores do território e o alicerce para o verdadeiro sucesso da restauração.