A confeiteira Tauã Brito, de 36 anos, denuncia a execução de seu filho, Wellington, de 20 anos, durante uma recente operação policial no Rio de Janeiro, que resultou em 121 mortes. Ela relata ter encontrado o corpo do jovem com as mãos amarradas, um indício de que ele já estava rendido antes de ser morto, e clama veementemente por justiça diante do que considera um massacre.
A Denúncia Chocante da Mãe
Em um relato emocionado à Agência Brasil, Tauã Brito compartilhou as últimas mensagens trocadas com Wellington na madrugada da terça-feira (28). Na ocasião, ela implorou para que ele permanecesse em casa, chegando a recomendar trechos do Salmo 91 da Bíblia, buscando proteção divina. Entretanto, a operação, considerada a mais letal da história do estado do Rio de Janeiro, teve um desfecho trágico para o jovem.
Tauã descreve o estado em que encontrou o filho, enfatizando que as mãos amarradas indicavam uma clara rendição. Além disso, ela questiona as circunstâncias da morte: “Se um policial conseguiu chegar no meu filho, amarrar o braço dele e dar uma facada nele, é porque ele não oferecia mais perigo. Então, por que não levou preso? No Brasil, não tem pena de morte. Se a pessoa não oferece perigo, tem que ser presa”, critica Tauã, que vem enfrentando uma onda de mensagens ofensivas. Em sua visão, a ação policial configurou um verdadeiro massacre.
A Trajetória de Wellington e a Luta de Tauã
Tauã, mãe solo de Wellington desde os 15 anos, narrou os desafios e o carinho com que criou o filho no Complexo da Penha. Ela se desdobrou em diversos trabalhos, como garçonete e vendedora, para garantir que Wellington concluísse o Ensino Médio e até conseguisse um emprego como jovem aprendiz em um supermercado. Ela recorda com afeto a infância de Wellington, descrevendo-o como uma criança amada, brincalhona, estudiosa e sempre cercada de amigos.
Posteriormente, a adolescência trouxe apreensão à mãe quando Wellington acabou se envolvendo com o tráfico de drogas. Apesar das tentativas de Tauã para que ele abandonasse a vida no crime e se mudasse para Rio das Ostras, o jovem recusou, permanecendo na comunidade. Sua irmã de sete anos, igualmente, recorda-se com saudade dos momentos de lazer e união familiar, como passeios de moto e jogos de dominó.
O Dia da Operação Fatal
Durante a madrugada da operação, que mobilizou 2,5 mil policiais nos complexos, Tauã manteve contato intenso com o filho. Ela implorou para que ele não saísse de casa e chegou a mediar uma possível rendição, porém, já era tarde demais. Pela manhã, Wellington estava na mata da Serra de Misericórdia, uma área cercada por policiais do Batalhão de Operações Especiais, que impediam o acesso e a saída.
Sem conseguir mais respostas do filho, Tauã tentou se dirigir ao local, mas foi barrada pelos policiais da Operação Contenção. À noite, ela esteve na porta do Hospital Estadual Getúlio Vargas, onde os primeiros corpos das vítimas chegavam, e apelou à imprensa por ajuda para adentrar a mata em segurança. Contudo, seu pedido foi em vão. Finalmente, após a retirada dos policiais, ela e o pai de Wellington subiram à mata. Com a luz de um celular, às 1h da manhã, Tauã encontrou o corpo do filho entre outros, com os punhos amarrados, um corte de faca no braço e um tiro na cabeça.
As Consequências Imediatas e o Luto
Tauã Brito reitera que, apesar de não apoiar as escolhas do filho, ele possuía o direito de se entregar e ser preso, e não de ser executado. Ela velou o corpo de Wellington na madrugada e manhã da quarta-feira (29), em meio a uma cena chocante na Praça São Lucas, no Complexo da Penha, onde 80 corpos foram enfileirados por moradores, em uma imagem que remetia à Chacina de Vigário Geral.
A mãe critica duramente o governador Cláudio Castro, questionando sua declaração de que a operação foi “bem-sucedida”. “Bem-sucedida para quem? O que mudou aqui dentro? A plataforma política dele é essa: oferecer corpos?”, indaga Tauã. Ela ainda denuncia o descaso na remoção e identificação dos corpos, que permaneceram horas expostos na mata e no sol, chegando em estado de decomposição ao IML. Consequentemente, Tauã foi forçada a realizar um enterro com caixão fechado, impedindo a despedida digna que desejava.
A Luta de Tauã por Justiça e Oportunidades
Apesar de toda a dor, Tauã encontra forças para transformar seu luto em uma denúncia pública. Ela busca não apenas esclarecer as circunstâncias da morte de Wellington, mas também clamar por oportunidades e políticas públicas para os jovens das favelas, que, em sua visão, são alvo constante de violência e morte. “A minha guerra acabou, mas tem muitas mães pedindo socorro para seus filhos, e minha luta será por eles também”, afirma.
A Resposta Oficial e a Contestação
As autoridades de segurança pública do governo do estado do Rio de Janeiro, por outro lado, classificaram a Operação Contenção como um sucesso. Em coletivas de imprensa, afirmaram que os criminosos que se entregaram foram detidos, enquanto os mortos foram aqueles que resistiram e tentaram atentar contra a vida dos policiais. O objetivo da ação, segundo o governo, era cumprir 100 mandados de prisão e 180 de busca e apreensão.
Além disso, a versão oficial apontou que o conflito foi estrategicamente deslocado para a área de mata para proteger os moradores dos complexos, considerados “quartel-general do Comando Vermelho”. O governador Cláudio Castro chegou a declarar que as únicas vítimas foram os quatro policiais mortos. Felipe Curi, secretário de Polícia Civil, defendeu a legitimidade da operação, refutando o termo “chacina”, que, segundo ele, designa “morte ilegal”. Em contraste, diversas entidades de defesa dos direitos humanos e movimentos de favelas classificaram a ação como “chacina” e “massacre”, exigindo uma investigação independente e rigorosa dos fatos.



