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Lula: Trump será convidado à COP30, mas não para falar de tarifas

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Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou, nesta terça-feira (5), que o ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, será convidado para a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30). O evento está agendado para novembro, em Belém, no Pará, e, conforme a declaração de Lula, o propósito do convite é debater exclusivamente a questão climática, afastando qualquer discussão sobre as recentes tarifas impostas por Washington sobre produtos brasileiros. Essa iniciativa visa, portanto, manter a diplomacia focada em temas de interesse global, mesmo diante de atritos comerciais.

O Convite à COP30 e a Disputa Tarifária

Nesta terça-feira (5), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva esclareceu sua posição em relação a Donald Trump, indicando que não buscaria contato direto para discutir as tarifas impostas, uma vez que, segundo ele, Trump não demonstraria interesse nessa conversa. Entretanto, o convite à COP30 surge com um objetivo distinto: compreender a perspectiva de Trump sobre a pauta climática. Tal declaração foi proferida durante a abertura da 5ª Reunião Plenária do Conselho de Desenvolvimento Econômico Social Sustentável (CDESS), conhecido como Conselhão, no Palácio Itamaraty, em Brasília.

Em um contexto de tensões comerciais, no dia 9 de julho, o então presidente norte-americano Donald Trump havia enviado uma carta ao líder brasileiro, anunciando a imposição de uma tarifa de 50% sobre todos os produtos brasileiros, com vigência prevista para 1º de agosto. Posteriormente, em 30 de julho, Trump assinou uma ordem executiva confirmando a taxação, embora tenha excluído quase 700 produtos da lista inicial. Esta medida, já ajustada, entrou em vigor no dia seguinte, 6 de agosto.

O Embate em Torno do Pix

Entre as justificativas apresentadas pelo governo norte-americano para a aplicação das tarifas, estava a menção de que o Brasil adotaria o que considerava “práticas comerciais injustas” por meio da utilização do sistema de pagamentos instantâneos, o Pix. Em contrapartida, Lula refutou veementemente esses argumentos, afirmando que o Pix representa um patrimônio nacional e, mais ainda, uma referência internacional de infraestrutura pública digital. Nesse sentido, o presidente brasileiro enfatizou que o país não deveria ser penalizado por desenvolver um sistema gratuito e altamente eficiente.

Adicionalmente, Lula fez uma provocação bem-humorada, sugerindo que o presidente Trump experimentasse o Pix nos Estados Unidos, utilizando-o para pagar alguma conta, a fim de reconhecer sua modernidade. Ele argumentou que a verdadeira preocupação por trás dessa “loucura contra o Brasil” seria o temor de que o Pix pudesse se expandir globalmente, ameaçando a predominância dos cartões de crédito. Nesse sentido, o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, informou que o governo federal apresentará uma resposta oficial aos Estados Unidos sobre a questão do Pix no próximo dia 18 de agosto.

Defesa da Soberania Nacional e Cenário Político

Em seu discurso no Conselhão, o presidente brasileiro reafirmou sua disposição para o diálogo e a negociação, mas ressaltou a importância do apoio dos empresários. Nesse ínterim, Lula recordou a figura de seu ex-vice-presidente, o industrial José Alencar, descrevendo-o como um empresário nacionalista que defendia os interesses do país. Ele lamentou, entretanto, a percepção de que há uma diminuição do número de empresários com essa mentalidade nos dias atuais, afirmando que muitos seriam mais “mercantilistas” do que “nacionalistas”, o que, em sua visão, torna a defesa do Brasil mais complexa.

Lula também fez questão de reafirmar que interesses político-eleitorais não devem contaminar as relações institucionais. Ele fez uma referência implícita ao deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) que, em março, licenciou-se do mandato para articular ações nos Estados Unidos contra a Justiça e a economia brasileiras, em uma aparente tentativa de defender seu pai, o ex-presidente Jair Bolsonaro, de um julgamento por suposta tentativa de golpe de Estado. Por conseguinte, Eduardo Bolsonaro é atualmente investigado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em razão dessa atuação.

Em suma, o presidente Lula descreveu o dia 30 de julho de 2025 como um “marco lastimável” na história das relações entre Brasil e Estados Unidos, qualificando a ação tarifária como arbitrária e um ataque direto à democracia, à soberania e à economia brasileiras. Ele frisou que nenhum “tarifazo” aplicado a outros países havia envolvido uma tentativa de ingerência nos poderes internos da nação afetada.

Estratégias Brasileiras e Acordos Internacionais

Diante do cenário desafiador, Lula assegurou que o governo atuará para proteger trabalhadores e empresas dos impactos das tarifas. Para tanto, um plano de contingência será implementado com o intuito de mitigar os prejuízos econômicos e sociais. Além disso, o presidente prometeu recorrer a todas as medidas cabíveis no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC), buscando a reversão da situação. A prioridade é salvaguardar a economia nacional e os empregos.

Em um movimento contínuo de expansão comercial, o presidente brasileiro defendeu a política de comércio exterior do Brasil, com a abertura de novos mercados ao redor do mundo. Consequentemente, Lula reiterou a promessa de assinar o acordo entre o Mercosul e a União Europeia (UE) ainda este ano, um objetivo que ganha destaque, especialmente porque o Brasil detém a presidência do bloco de países sul-americanos neste semestre. Ele alertou a União Europeia para que não haja endurecimento nas negociações, enfatizando que o acordo com o Mercosul seria uma “glória”, dado o respeito e a cidadania presentes nas propostas brasileiras.

Em contraste com a situação imposta ao Brasil, Donald Trump buscou acordos favoráveis aos Estados Unidos para evitar retaliações. Para a União Europeia, por exemplo, os EUA elevaram as tarifas de importação para 15% na maioria dos produtos, um percentual significativamente inferior aos 30% inicialmente anunciados. Em contrapartida, a Europa concordou em não aplicar o princípio da reciprocidade e, mais ainda, deve zerar as tarifas para produtos estadunidenses. Além disso, a UE se comprometeu a investir US$ 600 bilhões nos Estados Unidos, incluindo a compra de equipamentos militares, e a adquirir energia do país no montante de US$ 750 bilhões, sem que houvesse, por outro lado, qualquer anúncio de recursos dos EUA para a União Europeia. Lula reforçou que uma “parceria sólida se constrói com base em benefícios mútuos”.

Preocupações do Setor Produtivo e do Trabalho

Representando a Associação Brasileira dos Produtores e Exportadores de Frutas e Derivados (Abrafrutas), Priscila Nasrallah destacou que os mercados internacionais são cruciais para o crescimento e a continuidade da fruticultura no país. Ela solicitou ao governo uma atenção especial ao setor rural, especialmente aos pequenos produtores, e, por conseguinte, pediu que a entrada em vigor das tarifas fosse postergada. A fruticultura brasileira, que já posiciona o Brasil como o terceiro maior produtor de frutas do mundo, lida com produtos perecíveis que precisam ser colhidos a tempo, evidenciando a urgência da medida.

Priscila Nasrallah também reforçou a necessidade de proteger o pequeno produtor, que muitas vezes se organiza para exportar, realiza compras de embalagens com benefícios fiscais e se expõe ao câmbio para antecipar recursos para a produção e financiamento rural. Diante do iminente impacto, esses produtores precisarão de prazos estendidos, proteção e respaldo financeiro. Os Estados Unidos são um destino-chave para frutas como manga, uva, melão, melancia, mamão e frutas processadas; apenas em 2024, foram exportadas 77 mil toneladas desses produtos para o mercado norte-americano.

Paralelamente, Clemente Ganz, presidente do Fórum das Centrais Sindicais, manifestou a preocupação das entidades com a manutenção dos empregos nos setores afetados. As organizações de trabalhadores enviaram um documento ao governo com sugestões de medidas, enfatizando a oportunidade de “avançar na transição justa e inclusiva, numa nova estratégia comercial”. De acordo com ele, é fundamental que haja, ao longo dessa trajetória de desafios, um investimento no diálogo social, fortalecendo o entendimento entre trabalhadores, empresários e governo em torno de quatro pilares essenciais: inovação, investimento, emprego e incremento de produtividade.

Finalmente, uma das tarefas cruciais do movimento sindical, segundo Clemente Ganz, é mobilizar a sociedade. Nesse sentido, as entidades estão tomando iniciativas de articulação internacional com o movimento sindical dos Estados Unidos, do Canadá, da União Europeia e do México, com o objetivo de abordar a questão das tarifas sob a perspectiva da preservação do emprego. Além disso, o fórum também articula a participação das centrais sindicais, em conjunto com a Central Sindical Internacional, em discussões na Organização Mundial do Comércio.

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