A Justiça Federal impôs uma proibição à administração de São Paulo, impedindo a demolição de imóveis na Favela do Moinho, localizada no coração da capital paulista, até a próxima sexta-feira, 24 de outubro. Adicionalmente, a determinação judicial exige a imediata remoção dos entulhos acumulados no local, considerada a última área favelizada da região central.
Decisão Judicial Interrompe Demolições na Favela do Moinho
A medida foi emitida pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) em 18 de outubro, após um pedido conjunto da Defensoria Pública de São Paulo e da Defensoria Pública da União. Essa solicitação surgiu a partir de uma audiência crucial que reuniu representantes das esferas governamentais federal, estadual e municipal, evidenciando a complexidade da situação. A deliberação judicial, por conseguinte, estabelece um prazo rigoroso para a administração de Tarcísio de Freitas não apenas cessar as demolições, mas também para iniciar a limpeza da comunidade, comprometendo-se a dar continuidade a esse serviço à medida que novas estruturas forem desmanteladas.
Ações da CDHU e a Questão dos Entulhos
Conforme documentação do TRF3, a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo (CDHU) reportou ter cadastrado 931 famílias e habitações entre 14 de outubro e 2 de novembro de 2024. A companhia, aliás, assegurou que nenhuma família cadastrada será impedida de receber uma nova moradia sob o pretexto de ser considerada inelegível. Ademais, a CDHU informou que, até o momento, 632 famílias já selecionaram suas novas residências e deixaram a comunidade. Entretanto, a Defensoria Pública de São Paulo identificou 137 famílias com pendências, das quais 107 foram localizadas nos registros da CDHU, mas 30 não constavam no cadastro.
Ao todo, 122 casas já foram demolidas. No tocante à acumulação de entulhos dentro da comunidade, a CDHU justificou que houve restrições no acesso de maquinário pesado para a tarefa. Em virtude disso, as equipes tiveram que realizar o trabalho de forma mais lenta, citando fatores como a circulação de crianças na área de atuação das máquinas. A companhia, por outro lado, enfatizou em nota que as demolições são conduzidas com “todos os critérios técnicos para impedir danos a imóveis ainda ocupados”. No entanto, ressaltou que o avanço do processo é “fundamental”, visto que as estruturas precárias “expõem as pessoas que ainda circulam pelo moinho a riscos, sobretudo após a desocupação das casas”.
Perspectiva da Comunidade e Acordos Descumpridos
A comunidade, no entanto, apresenta uma narrativa diferente, alegando que a CDHU não honrou três dos termos acordados com os moradores. De acordo com os habitantes, apenas a gratuidade dos imóveis foi cumprida, um benefício alcançado graças à intervenção do governo federal na negociação. Além disso, uma apuração da Agência Brasil revelou que a maioria dos moradores ainda não se mudou para os novos imóveis. Para agravar a situação, o compromisso de oferecer endereços na zona central, próximos à comunidade original, também teria sido quebrado, forçando muitos a se deslocarem para regiões mais distantes.
Segurança Pública e Acusações de Abusos
A juíza federal Noemi Martins de Oliveira estabeleceu outro ponto crucial: a manutenção de equipes da Polícia Militar na favela, operando de forma “não ostensiva, mas preventiva”, para inibir novas ocupações, tanto de dia quanto à noite. Em resposta, a Secretaria da Segurança Pública afirmou, em mensagem enviada à Agência Brasil, que já mantém um efetivo na favela. Este efetivo, aliás, é incumbido de realizar o patrulhamento preventivo, com o objetivo de “garantir a segurança dos moradores, mantendo a ordem pública, o que inclui a coibição de novas invasões das áreas desocupadas na favela”. A PM, portanto, também continuará apoiando o trabalho da CDHU, visando resguardar a segurança dos servidores no local.
Em um episódio que gerou grande repercussão, oito pessoas, incluindo lideranças comunitárias, foram presas em setembro durante a Operação Sharpe, sob a acusação de ligações com o Primeiro Comando da Capital (PCC). Posteriormente, em uma audiência popular realizada no último sábado, 18 de outubro, lideranças locais reiteraram denúncias graves. Elas relataram táticas ilegais que teriam sido empregadas pela polícia para aterrorizar membros da comunidade, como o plantio de drogas ilícitas para incriminação injusta e a prática de tortura, gerando profunda preocupação.
Entenda o Histórico da Favela do Moinho e o Acordo Habitacional
A saga da Favela do Moinho remonta a meados de maio, quando o governo federal anunciou um acordo com o governo do estado. Esse pacto permitiu que os moradores da Favela do Moinho adquirissem imóveis de até R$ 250 mil. Essa intervenção federal ocorreu aproximadamente três semanas após o início das remoções, alterando significativamente o curso dos acontecimentos.
Inicialmente, a intenção do governador Tarcísio de Freitas era utilizar a área para a construção de um parque e da estação Bom Retiro da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM). Os imóveis previstos em sua ação coordenada teriam um valor máximo de R$ 250 mil para aqueles localizados na zona central e R$ 200 mil para outras localidades. Por conseguinte, a intervenção federal foi decisiva para a redefinição dos termos.
Revisão da Proposta e Habitação Gratuita
Com a revisão da proposta e a entrada do governo federal nas negociações, o valor máximo dos imóveis foi unificado em R$ 250 mil. Desse montante, o governo federal contribui com R$ 180 mil e o estadual com R$ 70 mil, ambos a fundo perdido, ou seja, recursos provenientes diretamente de seus orçamentos, sem a necessidade de reembolso. Em vista disso, essa articulação financeira permitiu que os moradores pudessem adquirir os imóveis gratuitamente, sem a necessidade de financiamento, representando uma conquista significativa para as famílias afetadas pela remoção na Favela do Moinho.



