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Investigação de mortes no RJ: ONG vê falhas e ‘desinteresse proposital’

ONG Human Rights Watch acusa polícia do RJ de "desinteresse proposital" e falhas cruciais na investigação de 121 mortes da Operação Contenção, em 28 de outubro.
HRW falhas investigação RJ
Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil

A Human Rights Watch (HRW), renomada organização não governamental de defesa dos direitos humanos, lançou sérias acusações contra a polícia do Rio de Janeiro, apontando “falhas cruciais” na investigação das 121 mortes registradas durante a Operação Contenção, ocorrida em 28 de outubro. De acordo com a entidade, essa inação e as deficiências investigativas revelam um “desinteresse proposital”, especialmente porque as vítimas pertencem majoritariamente à população negra e de baixa renda. Essa postura, portanto, levanta preocupações significativas sobre a condução das apurações e a garantia de justiça.

As Acusações da Human Rights Watch

Em uma nota pública, a Human Rights Watch detalhou as deficiências observadas, destacando que a polícia fluminense falhou em preservar os locais dos tiroteios, uma medida fundamental para a análise forense e para a determinação das circunstâncias exatas de cada óbito. Consequentemente, a ausência de isolamento das cenas e de perícia adequada compromete a coleta de informações vitais, como a confirmação de que os indivíduos falecidos efetuaram disparos de armas de fogo ou não. César Muñoz, diretor da Human Rights Watch no Brasil, expressou profunda preocupação com o cenário. Ele afirmou que “etapas cruciais da investigação não foram realizadas e que provas importantes podem já ter sido perdidas”, sublinhando a gravidade da situação e o impacto irrecuperável na busca pela verdade.

O Cenário da Operação Contenção

A Operação Contenção, desencadeada em 28 de outubro, mobilizou cerca de 2.500 policiais de diversas unidades do Rio de Janeiro. O objetivo era atacar pontos estratégicos da facção Comando Vermelho em bairros dos complexos do Alemão e da Penha, na zona norte da capital. Em seu primeiro dia, a operação foi marcada por intensos tiroteios, resultando na morte de 64 pessoas, entre as quais civis desarmados e crianças. Além disso, as demais mortes ocorreram em uma área de mata na serra da Misericórdia, após uma emboscada realizada pelo Batalhão de Operações Policiais Especiais (BOPE) contra uma das rotas de fuga da facção. Posteriormente, moradores locais descobriram os corpos, transportando-os para uma praça na Penha e documentando amplamente a cena de barbárie em seus celulares. Essas imagens começaram a circular massivamente já na manhã de 29 de outubro, alcançando repercussão inclusive fora do estado. Familiares das vítimas relataram a jornalistas a presença de sinais de rendição, como mãos e pernas amarradas, além de indícios de execução e tortura em seus entes queridos. A Human Rights Watch enfatiza, ainda, a predominância de vítimas negras e de baixa renda entre os mortos, reforçando o padrão de vulnerabilidade.

Exigências por Transparência e Independência

Diante do quadro, a Human Rights Watch e seu diretor no Brasil, César Muñoz, fizeram um apelo veemente às autoridades. Eles exigem “uma investigação rápida, completa e independente de cada uma das mortes, bem como das decisões e do planejamento que levaram a uma operação tão desastrosa”. Além disso, Muñoz ressaltou a urgência de o governador do Rio de Janeiro apresentar um projeto de lei que promova a separação da perícia da Polícia Civil. O objetivo é assegurar um investimento em análises forenses independentes e de alta qualidade, consideradas um pilar fundamental em qualquer investigação criminal séria. Adicionalmente, a ONG criticou a dificuldade de acesso da Defensoria Pública e de observadores independentes ao Instituto Médico Legal, para onde os corpos foram removidos. Entre as medidas recomendadas pela Human Rights Watch estão a presença de peritos independentes e a condução das investigações pelo Ministério Público, visando garantir imparcialidade e rigor.

Até o momento, as polícias civil e militar do Rio de Janeiro, procuradas pela reportagem, não se manifestaram sobre as críticas e acusações levantadas pela Human Rights Watch. O silêncio, por sua vez, apenas intensifica o debate público sobre a transparência e a responsabilidade das forças de segurança em operações de grande porte.