O general Júlio Cesar de Arruda prestou depoimento no Supremo Tribunal Federal (STF) na quinta-feira, 22 de junho, explicando sua decisão de impedir a ação da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) contra manifestantes bolsonaristas acampados em frente ao Quartel General do Exército no dia 8 de janeiro de 2023.
Justificativa da Ação no 8 de Janeiro
Segundo Arruda, a proibição da ação imediata da PM tinha como objetivo coordenar as prisões, evitando assim possíveis confrontos e consequentes vítimas. Essa justificativa contrapõe-se à ordem do ministro Alexandre de Moraes para prisões em flagrante. O general, que era comandante do Exército na época, argumentou que a abordagem coordenada era crucial para minimizar riscos de violência e mortes. A decisão, porém, resultou em sua demissão semanas depois pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O depoimento ocorreu no contexto da ação penal que investiga o chamado “núcleo crucial” de um suposto golpe de Estado, que visava manter Jair Bolsonaro no poder após sua derrota nas eleições de 2022. Arruda foi chamado a depor como testemunha de defesa do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro e delator do caso. Embora conhecesse Cid por contatos esporádicos na carreira militar, o general negou ter conhecimento de qualquer envolvimento do tenente-coronel com planos golpistas.
Pressões e Decisão de Coordenar as Prisões
Após o depoimento inicial à defesa de Cid, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, questionou Arruda sobre os eventos do dia 8 de janeiro. Naquele dia, após a invasão e depredação das sedes dos Três Poderes em Brasília por apoiadores de Bolsonaro, o ministro Alexandre de Moraes havia determinado a prisão em flagrante dos manifestantes acampados em frente ao QG do Exército. Em contraponto a essa ordem, Arruda impediu a entrada da PM, com tropas e tanques, no local. As prisões, então, só foram efetuadas na manhã seguinte.
Em sua defesa, Arruda declarou que não se negou à intervenção da PM, mas sim argumentou pela necessidade de coordenação. Ele relatou um telefonema recebido do general Gustavo Henrique Dutra de Menezes, então comandante militar do Planalto, alertando sobre a iminente chegada da polícia e a intenção de prender todos os manifestantes. Em resposta, Arruda enfatizou a importância de uma ação coordenada. Posteriormente, ele se reuniu com os ministros José Múcio (Defesa), Flávio Dino (Justiça) e Rui Costa (Casa Civil), além de Ricardo Capelli, interventor da Segurança Pública do DF, decidindo que as prisões ocorreriam apenas no dia seguinte. Mais de 1.400 pessoas foram presas e detidas pela PM.
Confronto com Moraes e Consequências
O ministro Alexandre de Moraes confrontou o general com o depoimento do então comandante da PMDF, coronel Fábio Augusto Vieira, à Polícia Federal. Vieira alegou ter sido impedido por Arruda, que teria dito, com dedo em riste, “minha tropa é um pouco maior que a sua”. Arruda, questionado por Moraes sobre essa afirmação, respondeu que não se lembrava, mas reiterou a necessidade de uma ação coordenada para evitar violência. Ele concluiu sua declaração afirmando que, graças à coordenação das prisões, não houve mortes.
Depoimentos Adicionais e Prosseguimento do Julgamento
Além do depoimento de Arruda, outras quatro testemunhas de Cid foram ouvidas, todas militares sem ligação direta com os fatos investigados, mas amigas e colegas do tenente-coronel na Ajudância de Ordens da Presidência da República. A estratégia da defesa visava destacar os bons antecedentes militares e disciplinares de Cid, refutando qualquer envolvimento com planos golpistas. Todas as testemunhas descreveram Cid como um militar reservado e profissional, sem envolvimento em questões político-partidárias.
A Primeira Turma do Supremo iniciou na segunda-feira (19) a oitiva das 82 testemunhas arroladas pela acusação e defesas na ação penal que investiga o núcleo central do suposto golpe. Bolsonaro figura entre os réus, acusado pela PGR de liderar e se beneficiar da trama golpista. Após os depoimentos da defesa de Mauro Cid, as audiências seguiram com as testemunhas de Anderson Torres e Walter Braga Netto. O ministro Moraes proibiu gravações das audiências, mas permitiu a presença de jornalistas.