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Festas Juninas: Fé, Folclore e Sabores de uma Tradição Europeia

Festas Juninas: Tradição europeia que celebra fé e folclore no Brasil. De origem católica, as festas misturam devoção a santos como São João, comidas típicas e danças como a quadrilha, num ritual que celebra a colheita e a cultura popular brasileira.
Festas Juninas brasileiras: origem e tradições
Foto: Agência Brasil/Marcello Casal Jr

Festas Juninas: Uma Tradição Europeia que Encanta o Brasil

As vibrantes festas juninas brasileiras, com suas fogueiras, quadrilhas e saborosas comidas típicas, possuem raízes profundas na Europa católica. Introduzidas no país pelos portugueses durante a colonização, elas celebram as solenidades de Santo Antônio, São João Batista, São Pedro e São Paulo, mesclando devoção religiosa com manifestações culturais populares. Mais do que simples datas litúrgicas, essas festas representam, segundo a professora Ana Beatriz Dias Pinto, doutora em Teologia pela PUCPR, experiências coletivas que unem fé, gastronomia, dança e memórias afetivas.

Um Encontro de Fé, Folclore e Sabores

Para a professora Ana Beatriz, cada elemento das festas juninas carrega um significado profundo. A fogueira, por exemplo, é mais que um simples símbolo: “Cada arraial, cada fogueira acesa e cada simpatia feita com fé expressam uma catequese viva, transmitida não por livros, mas por gestos, sabores e ritmos que constroem um universo de sentidos para a religiosidade popular e dizem muito sobre nossa cultura”, afirma ela. A tradição da fogueira, segundo a especialista, remonta a um acordo entre Isabel e Maria, primas grávidas, que combinaram acender uma fogueira ao nascimento de João Batista, um sinal que perdura até hoje nos festejos juninos.

Além disso, a fogueira representa a luz que vence a escuridão, a esperança de purificação e a queima simbólica de energias negativas. O ato de pular a fogueira, explica a professora, simboliza purificação e renascimento: “No Brasil, isso se popularizou ao ponto de virar a cantiga ‘Pula a fogueira, ioiô’. Esse gesto é um arquétipo de purificação, de queimar energias e experiências negativas, reduzindo a cinzas o que não é bom para a vida”. O arraial, por sua vez, é uma recriação de uma aldeia sagrada, uma miniatura da organização social católica, colorida e festiva, que celebra a cultura caipira e sua contribuição alimentar aos centros urbanos.

Quadrilha, Pau de Sebo e Quermesse: Um Espetáculo de Tradições

Entre as inúmeras tradições juninas, a quadrilha, dança de casais que evoluiu das danças de salão francesas, se destaca pela sua coreografia elaborada. Outro elemento presente é o pau de sebo, que, para a professora Ana Beatriz, transcende a interpretação de alguns como símbolo fálico: “Enquanto alguns o veem como simbolismo fálico, como pecado, algo do demônio, outros veem só como diversão. O fato é que pela cultura popular, o pau de sebo é tão somente uma brincadeira de festa junina”. A competição pelo prêmio na ponta do pau de sebo, seja uma imagem de Santo Antônio ou outro objeto desejado, completa a brincadeira.

Em seguida, temos a quermesse, cuja origem remonta ao flamengo “kerkmisse”, da região da Flandres (atual Bélgica). Inicialmente um evento beneficente, a quermesse incorporou elementos como forró, jogos, bingos e barracas de comidas, como o cachorro-quente, no Brasil. Conforme explica Ana Beatriz, a quermesse “no fundo, continua sendo celebração comunitária, de agradecimento pelas colheitas e para celebrar que o povo quer missa, mas também quer festa, união, convivência e amizade. Valores presentes à formação social brasileira no campo e na cidade”.

A Gastronomia Junina: Um Banquete de Sabores da Colheita

As festas juninas brasileiras também são sinônimo de fartura gastronômica. A época coincide com a colheita de milho, amendoim, pinhão e uva, ingredientes principais de pratos como canjica, pamonha, bolo de milho, curau e pé-de-moleque. Bebidas como quentão e vinho quente, de origem portuguesa, complementam a festa com a função social de aquecer corpo e alma. “Todos representam uma forma de Ação de Graças a um plantio bem-sucedido, em forma de gratidão disfarçada de quitute”, destaca a professora.

As Festas Juninas na Era Digital: Um Ritual de Pertencimento

Por fim, Ana Beatriz reforça a importância das festas juninas na atualidade, mesmo com a proliferação das tecnologias digitais. Ela as enxerga como um ritual coletivo que fortalece laços, resgata memórias afetivas e expressa uma espiritualidade popular legítima, transmitindo sentimentos de pertencimento, alegria e esperança. “As festas juninas são expressão simbólica do imaginário devocional e cultural brasileiro, com direito a muitas orações, simpatias e à consciência simbólica de que o ano chegou à sua metade, convidando cada um de nós a olhar para trás, agradecer, e reacender a fé para o que ainda está por vir”, conclui a professora.