A Matilha Cultural, espaço vibrante no coração de São Paulo, sedia até 22 de novembro uma mostra provocativa que lança um olhar crítico sobre as políticas de drogas no Brasil. A exposição explora os multifacetados impactos sociais e ambientais dessas políticas, além de suas intrínsecas relações com o racismo estrutural e as dinâmicas da segurança pública, instigando o público a uma reflexão profunda sobre um tema complexo e urgente.
Exposição no Matilha Cultural Ilumina Conexões Complexas
Intitulada “Reformar – políticas de drogas, Restaurar – direitos e Recuperar – natureza”, a ocupação visa elucidar a intrincada teia que conecta pautas ambientais a questões cruciais como o tráfico de narcóticos, a segurança cidadã, o racismo sistêmico e a expressão artística. Consequentemente, a mostra desafia os visitantes a reconhecerem como esses elementos se entrelaçam e afetam diversas camadas da sociedade.
A instalação, que permanece aberta ao público até o dia 22 de novembro, é fruto de uma colaboração entre a Matilha Cultural e a curadoria da VIST Projects, sendo concebida no âmbito do projeto Intersecção. Ademais, essa iniciativa representa um esforço conjunto para desmistificar e aprofundar o debate sobre um dos temas mais polarizadores da atualidade.
Uma Plataforma para Diálogos Essenciais
O projeto Intersecção é uma articulação estratégica entre a Iniciativa Negra e a Coalizão Internacional pela Reforma da Política de Drogas e Justiça Ambiental. Dessa forma, seu principal objetivo consiste em fomentar conversas abertas e esclarecedoras sobre desafios que, embora afetem a população em geral, impactam desproporcionalmente grupos minorizados. Entre eles, destacam-se mulheres, pessoas LGBTQIA+, indivíduos negros, indígenas e pessoas com deficiência, que frequentemente sofrem as consequências mais severas das políticas proibicionistas.
Programação Diversificada: Imagens, Cinema e Debates
A programação da exposição é rica e multifacetada. Por exemplo, os visitantes podem contemplar uma potente exposição fotográfica que documenta a Cracolândia, uma área da capital paulista notoriamente associada ao uso de drogas. As imagens são assinadas por talentos como o mexicano Yael Martinéz e o brasileiro Rafael Vilela, este último vencedor do prestigiado POY-Latam 2025 de fotografia documental, garantindo um olhar sensível e crítico sobre a realidade.
Paralelamente, o Cine Matilha exibe uma série de filmes que se alinham com as temáticas abordadas na mostra, proporcionando uma imersão audiovisual nos diversos aspectos do universo das drogas. Além disso, o público tem a oportunidade de participar de rodas de conversa com especialistas e acadêmicos, bem como oficinas e debates, o que enriquece a experiência e estimula o pensamento crítico.
Mapeando a Cadeia da Cocaína: Os Dez Arquétipos
Central para a mostra, uma das propostas dos coletivos é apresentar arquétipos dos locais onde a cocaína é produzida e consumida na América Latina. O intuito é que os visitantes saiam do centro cultural com uma compreensão mais aprofundada da complexidade do cenário atual. Esse esforço ganha ainda mais relevância ao considerar a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30), agendada para novembro em Belém, estabelecendo uma conexão direta entre as políticas de drogas e as pautas ambientais globais.
A curadoria desenvolveu dez arquétipos para garantir uma representatividade abrangente. Consequentemente, esses personagens representam diferentes contextos e regiões da cadeia de valor da coca e da cocaína na América Latina. São eles: uma planta de coca, uma coletora de coca afro-boliviana, uma defensora de terras indígenas, o Rio Amazonas, uma pessoa que trabalha em um laboratório de cocaína, uma ribeirinha, a onça-pintada, um vendedor de drogas, um usuário de cocaína e uma fiscal da autoridade portuária. Cada um desses arquétipos oferece uma perspectiva única sobre o problema.
Desafios da Proibição e o Fortalecimento de Facções
No âmbito da segurança pública, as facções criminosas representam um dos maiores desafios contemporâneos. Elas obtiveram um enriquecimento substancial através do tráfico ilícito de drogas, explorando a América do Sul como uma região-chave no abastecimento da produção mundial. Rebeca Lerer, coordenadora do Intersecção e representante latino-americana na International Coalition on Drug Policy Reform and Environmental Justice, ressalta a complexidade dessa dinâmica.
Ela observa que “muitas vezes parece que as facções surgem do nada, mas na realidade, elas se capitalizam enormemente com as drogas proibidas”. Lerer argumenta que a fragmentação das discussões sobre essas temáticas impede o avanço do país. “Apesar do vasto trabalho acadêmico que diagnostica sintomas como o encarceramento em massa, a violência policial e a corrupção, há uma falha em focar nas causas raízes”, explica. “Uma das principais causas é, nitidamente, a política de proibição, cujo resultado mais evidente é o fortalecimento de um mercado transnacional armado e cada vez mais poderoso.”
Lerer enfatiza a necessidade de reorientar o debate: “Nosso objetivo é desviar a discussão do clichê ‘droga é boa ou ruim, certa ou errada’. Embora cada um tenha sua opinião, isso não altera o fato de que a política atual não funciona. Ela não protege as pessoas, não resguarda as instituições ou os territórios, nem impede que o dinheiro do tráfico fortaleça organizações criminosas.”
Arte e Cultura em Destaque
Inaugurada em 23 de setembro, a mostra também apresenta uma programação cultural e musical diversificada. Diversos artistas de renome sobem ao palco, incluindo o rapper Dexter, o grupo Pagode na Lata, Linn da Quebrada, Família Tamarineira, DJ KL Jay, Ti.ram.ba.ço e a banda Aláfia, oferecendo performances que enriquecem o ambiente da exposição.
Além das apresentações, a jornalista Cecília Olliveira lançará seu livro “Como nasce um Miliciano” no dia 1º de novembro, às 19h, promovendo um debate sobre um tema igualmente relevante para a segurança pública brasileira. Para conferir a programação completa e retirar os ingressos gratuitos para as atividades, os interessados podem acessar o link disponível via Sympla. Para as atividades realizadas no espaço do Cine Matilha, a retirada dos ingressos ocorrerá por ordem de chegada, garantindo acesso democrático.
Serviço: Informações para Visitação
A exposição “Reformar – políticas de drogas, Restaurar – direitos e Recuperar – natureza” estará aberta até 22 de novembro, de terça a domingo, das 14h às 20h. Visitas monitoradas estão disponíveis de terça a sábado, no mesmo horário. O evento acontece na Matilha Cultural, localizada na Rua Rêgo Freitas, 542, República, em São Paulo. A entrada é gratuita, com ingressos disponíveis via Sympla. Menores de 18 anos devem estar acompanhados por um responsável. O local oferece acessibilidade para pessoas com locomoção restrita, garantindo que todos possam participar dessa importante iniciativa.