Talvez nenhum grande nome do cinema americano contemporâneo seja tão acompanhado de lendas quanto David Fincher. O diretor de Clube da Luta, Seven, Garota Exemplar e agora O Assassino é famoso por demandar dezenas de takes de seus atores até mesmo para algo aparentemente banal, como sentar num sofá ou segurar uma caneta, repetir cenas porque não gostou do jeito que um figurante andava, e assim vai. Exatidão é talvez a primeira palavra associada ao seu trabalho.
Perversão talvez seja a segunda. Fincher, uma vez, respondeu que sua visão de mundo é a de que todos os seres humanos são pervertidos. É surpresa que ele tenha feito tantos filmes sobre assassinos em série, como Zodíaco e Millenium? A atração por eles parece clara. Esses criminosos são metódicos, repetitivos e perfeccionistas. Em O Assassino, traçar os paralelos entre o diretor e o protagonista ficou mais fácil do que nunca, mas os quebra-cabeças de Fincher estão visíveis desde seu primeiro trabalho, um comercial para a sociedade de combate ao câncer dos EUA onde um feto, à la 2001, fuma um cigarro.
Fincher busca esse tipo de imagem pela mesma razão que repete tantos takes. Ele justifica a iteração das cenas como uma maneira de remover qualquer artifício e maquiagem do ator, assim capturando algo genuinamente humano. Em sua filmografia, este realizador tem a missão de encontrar o que está por baixo de todos os enigmas através dos quais nos escondemos, e se ele encontra algo feio e assustador lá, é isso que veremos.
Listando os filmes abaixo, uma série de colaborações com grandes artistas à frente (Brad Pitt, Rosamund Pike, Jake Gyllenhaal, Michael Fassbender) e atrás das câmeras (Erik Messerschmidt, Kirk Baxter e, claro, Trent Reznor & Atticus Ross) vemos tudo aquilo encontrado por Fincher em sua descida às profundezas dessa humanidade perversa. Monstros, psicopatas, matadores e filmes inacreditavelmente fáceis de assistir. Fincher alia perspectiva e entretenimento como niinguém.
Assim como no nosso ranking do Scorsese, preciso dizer: não há um só item ruim. Vamos lá:
12. Alien³
O primeiro filme de David Fincher quase foi seu último. O diretor pensou em abandonar a carreira depois de ver o quanto executivos de estúdio interferiram em sua visão para o que terminou sendo um competente, mas falho, filme de Alien. Ele pode detestar o resultado final, mas Alien³ tem seus méritos, como a boa construção da atmosfera no planeta e algumas sequências inspiradas com o monstro em questão.
11. O Curioso Caso de Benjamin Button
Nenhum filme nessa lista é tão emocionalmente acessível quanto o curioso caso do homem que nasce velho e morre jovem, e nenhum parece revelar tanto seu diretor em busca de reconhecimento. De fato, Benjamin Button rendeu a Fincher sua indicação ao Oscar, uma instituição que lhe desrespeita filme após filme, mas apesar de ter momentos genuinamente tocantes, esse filme pouco faz para manter-se em nossa mente como alguns outros títulos aqui presentes.
10. O Quarto do Pânico
O primeiro exemplo de David Fincher não aspirando muito mais do que fazer um bom trabalho de gênero em sua área favorita (suspense) e saindo de lá com algo incrível. Este intenso e visualmente impecável filme de invasão domiciliar pega um material e cenário aparentemente simples e extrai de lá as sequências e interações mais complexas possíveis, sem nunca deixar de ser cativante e divertido.
9. Vidas em Jogo
Um quebra-cabeças de brincadeiras de mal gosto que termina com morte e loucura. Vidas em Jogo usa o combustível da paranoia para nos colocar numa montanha russa kafkiana cujo destino, a realização e superação pessoal, vira a piada suprema. Há um prazer perverso em fazer o diretor colocar Michael Douglas em situações cada vez mais absurdas, e somos aos poucos infectados pelo desespero, e pelo humor.
8. Mank
Este é, ouso dizer, o filme mais engraçado e bem-humorado de David Fincher, ainda que como seus outros trabalhos, Mank seja uma denúncia dos piores comportamentos possíveis. Neste caso, o seu viés da história do roteirista de Cidadão Kane, num roteiro escrito por seu pai, contrapõe a recriação exata do visual e som dos filmes da Era de Ouro de Hollywood com a escuridão da qual eles tipicamente fugiam. Aqui, Fincher levanta o tapete e mostra a sujeira de toda uma época.
7. Millenium: Os Homens Que Não Amavam as Mulheres
Diz a lenda que Fincher ficou tão impressionado com Rooney Mara em A Rede Social, que decidiu escalá-la como Lisbeth Salander apenas com base naquela cena. A decisão, claro, foi acertada. Em seu mais sombrio e cético trabalho até hoje, ele coloca uma faísca rebelde no centro. A tensão entre a energia dela e a frieza dos arredores é trabalhada nos processos que levam até a busca de uma simples e poderosa verdade: homens são horríveis.
6. O Assassino
Um ácido e hilário suspense que traça diversos paralelos entre seu diretor e o protagonista sem nome de Michael Fassbender, como a obsessão por detalhes, repetição de processos e visão de mundo cínica. O verdadeiro sucesso de O Assassino, porém, vem da forma como ele zomba de ambos homens, contrapondo essa frieza distante com a inescapável realidade de que errar é humano, seja você seja um diretor de cinema ou matador de aluguel.
5. Garota Exemplar
A mais perversa comédia romântica já feita. No processo de rir de Ben Affleck e arrancar a melhor atuação da vida de Rosamund Pike, Fincher coloca sua mira nos subúrbios americanos e no sensacionalismo da mídia. A piada mais irônica desse suspense espetacular, porém, vem em como ele descontrói o final feliz, terminando com a mesma imagem que abre o filme, mas colocando todas as emoções ao contrário. Felicidades ao casal.
4. Clube da Luta
Uma afiada crítica à sociedade do consumismo, ou uma zombaria daqueles que se dizem anarquistas dentro desse meio? Uma celebração tóxica do resgate da masculinidade ou uma crítica da audiência que o enxerga assim? Clube da Luta permite diversas interpretações, e elas parecem mudar dependendo da fase de vida na qual estamos ao assisti-lo. Talvez nunca tenhamos uma resposta, ou talvez a resposta seja que ele é isso tudo ao mesmo tempo, e sua conclusão diz mais sobre você.
3. Seven: Os Sete Crimes Capitais
Assim como o #2, Seven está firme na briga pelo título de melhor filme de serial killer já feito. Traçando a vida urbana como uma piscina de pecados e morte, Seven provoca ao deixar as mais horripilantes cenas de crimes e loucura infinitamente magnéticas, desarmando personagens e audiência no caminho para uma armadilha que, claro, foi posta desde o começo pelo diretor e pelo criminoso. O que está na caixa? Você já sabe.
2. Zodíaco
Um tratamento sobre obsessão, e em especial, sobre homens obcecados com mistérios, quebra-cabeças e, em especial, com assassinos em série; investigadores dispostos a analisar cada grão em busca de detalhes e pistas sobre a verdade, e que no processo enlouquecem e se frustram. Quem disse que David Fincher só falou sobre si mesmo em O Assassino? Zodíaco encontra prazer nesse vício, e horror na conclusão.
1. A Rede Social
O filme mais importante para entender o Século 21. Como viemos parar numa sociedade onde os trolls irritados do mundo digital parecem estar pautando a política, guerra e mídia? Por que nossa informação e atenção virou a moeda mais valiosa da economia? A Rede Social não é uma adaptação exata da criação do Facebook, mas é algo melhor; uma análise empolgante, divertida e perturbadora da criação do mundo onde vivemos, um lugar abastecido por um algoritmo de inveja e mentiras, onde as regras sociais foram reorganizadas para recompensar os piores comportamentos. Mas ei, pelo menos você pode fazer amigos.
Fonte: https://www.chippu.com.br/noticias/david-fincher-qual-melhor-filme-ranking-lista-garota-exemplar-clube-da-luta-seven