A promessa de energia limpa e seus efeitos inesperados
A transição energética global busca reduzir a dependência de combustíveis fósseis. Entretanto, ela também provocou uma corrida intensa por minerais essenciais, como lítio, níquel e cobre.
No Brasil, essa procura já gera impactos preocupantes. Segundo o Observatório da Mineração, estados como Minas Gerais, Pará, Goiás e Bahia registram alterações climáticas significativas, como aumento de dias secos, chuvas fora de época e eventos extremos.
Assim, a mineração, que deveria apoiar a sustentabilidade, acaba acelerando a crise climática em diversas regiões sensíveis.
Vale do Lítio: oportunidades econômicas e riscos para comunidades
O Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, se tornou um símbolo dessa nova corrida mineral. A região concentra cerca de 80% das reservas nacionais de lítio, então atrai bilhões de dólares em investimentos.
Mas o crescimento econômico traz sérias consequências. Cleonice Pankararu, liderança indígena da Aldeia Cinta Vermelha Jundiba, relatou que, desde 2017, os efeitos da mineração na saúde da população se intensificaram.
“Antes, a gente gripava raramente. Agora, gripamos o tempo todo e surgiram muitos problemas gastrointestinais”, afirmou. Com isso, a comunidade sofre também com a contaminação dos rios e o desaparecimento de cursos d’água importantes.
Água, energia e um equilíbrio ameaçado
Além dos impactos na saúde, a mineração exige consumo intenso de água e energia. De acordo com o estudo, de 32% a 39% das sub-bacias hidrográficas de Minas Gerais, Goiás e Bahia já registram declínio alarmante na extensão dos rios.
Além disso, a mineração e a siderurgia juntas consomem aproximadamente 11% de toda a energia elétrica brasileira, apesar de representarem apenas 3% do Produto Interno Bruto (PIB).
Portanto, o atual modelo de extração ameaça tanto a disponibilidade de água quanto a estabilidade do fornecimento de energia no país.
Pará na COP30: vitrine e contradição ambiental
Enquanto o Pará se prepara para sediar a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30), enfrenta um paradoxo: o estado lidera a lista dos mais afetados pelos impactos da mineração.
Produzindo cerca de 90% do alumínio nacional, o Pará já mostra sinais de vulnerabilidade a eventos climáticos extremos. Por isso, a corrida por minerais críticos, ao invés de resolver o problema ambiental, pode agravá-lo.
Recomendações para conter a crise
Diante desse cenário, o relatório recomenda ações urgentes. Entre elas estão o fortalecimento do licenciamento ambiental, a criação de políticas públicas mais rígidas e a atuação firme do Estado como regulador, e não como parceiro das mineradoras.
Maurício Angelo, diretor do Observatório da Mineração, destacou: “Não podemos aceitar que o Estado atue como sócio das mineradoras. É preciso fiscalização robusta e independente”.
Assim, só com mudanças estruturais será possível conciliar desenvolvimento econômico e preservação ambiental.
Futuro em disputa: a resistência das comunidades tradicionais
Enquanto a mineração avança rapidamente, povos indígenas e comunidades tradicionais lutam para garantir seu modo de vida.
Cleonice Pankararu expressa sua preocupação: “Temos um Congresso que não defende os indígenas nem o meio ambiente. As licenças ambientais saem com muita facilidade, e a mineração não para de crescer”, lamentou.
Portanto, é urgente equilibrar a necessidade de minerais para a transição energética com a proteção dos territórios tradicionais e da natureza.