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Censo 2022: Falantes de línguas indígenas crescem quase 50% no Brasil

Censo 2022 do IBGE aponta crescimento de quase 50% no número de falantes de línguas indígenas no Brasil em 12 anos, chegando a mais de 433 mil pessoas.
Censo 2022 falantes línguas indígenas
Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

O Brasil registra um crescimento notável no número de falantes de línguas indígenas, conforme revelam os dados do Censo Demográfico 2022, “Etnias e línguas indígenas”, divulgado recentemente pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). De fato, nos últimos doze anos, houve um aumento de quase 50% neste grupo populacional, saltando de 293.853 em 2010 para 433.980 indivíduos com cinco anos ou mais de idade que utilizam uma língua indígena.

Expansão dos Falantes em Diferentes Contextos

Essa ascensão linguística não se restringiu apenas às Terras Indígenas (TIs). Pelo contrário, o número de falantes fora desses territórios mais que dobrou no período, passando de 44.590 para 96.685 pessoas, o que representa um acréscimo de 52.095 indivíduos. Além disso, ao considerar o universo de falantes com dois anos ou mais, o total em 2022 alcança a marca de 474.856 pessoas, dado que não foi mensurado no censo anterior. A maioria desses falantes, precisamente 78,34%, reside em Terras Indígenas.

Em seguida, os dados do Censo 2022 identificaram um total de 295 línguas indígenas em uso, demonstrando uma diversidade ainda maior em comparação com as 274 registradas em 2010. O levantamento considerou as línguas empregadas para a comunicação habitual nos domicílios, enfatizando a vitalidade dessas tradições.

Concentração Geográfica e Relevância Municipal

As maiores concentrações de falantes de línguas indígenas estão localizadas em estados como Amazonas, com 137.421 pessoas, Mato Grosso do Sul, com 58.901, e Mato Grosso, que contabiliza 42.511. De modo geral, o fenômeno é abrangente, visto que pelo menos uma pessoa indígena com dois anos ou mais fala uma língua indígena em 1.990 municípios brasileiros.

Posteriormente, o estudo do IBGE destacou a diversidade linguística presente em grandes centros urbanos. Manaus, por exemplo, sobressai como o município com a maior quantidade de línguas indígenas declaradas, somando 99. Logo depois, São Paulo aparece com 78 línguas, e Brasília com 61. Fora das capitais, outros municípios também se destacam, como São Gabriel da Cachoeira (AM), que registra 68 línguas indígenas, Altamira (PA), com 33, e Iranduba (AM), com 31.

Ademais, algumas línguas apresentam um número significativamente alto de falantes. A língua Tikuna, por exemplo, é a mais falada, com 51.978 pessoas, sendo que 87,69% delas residem em Terras Indígenas. Em seguida, a Guarani Kaiowá conta com 38.658 falantes, com a maioria (81,83%) também em TIs, e a Guajajara, com 29.212 pessoas, 90,43% delas em TIs. Por outro lado, a Nheengatu emerge como a língua indígena mais falada em áreas urbanas, totalizando 13.070 falantes, dos quais 41,94% vivem em cidades.

Políticas Públicas e o Reconhecimento Linguístico

Fernando Damasco, gerente de Territórios Tradicionais e Áreas Protegidas do IBGE, ressaltou a importância do mapeamento desses falantes. Segundo ele, este conhecimento é fundamental para que os municípios possam desenvolver políticas públicas eficazes que reconheçam e valorizem essas línguas, e, em decorrência disso, promovam maior acesso e cidadania para os povos indígenas. A oficialização das línguas, conforme Damasco, “contribui decisivamente para o acesso à cidadania e para o exercício de direitos”, ao facilitar a tradução de documentos formais e assegurar a presença de intérpretes em órgãos públicos. Portanto, a distribuição dos falantes indica quais municípios devem ser prioritários em termos de políticas de reconhecimento e oficialização das línguas indígenas.

Análise Percentual e Valorização Cultural

Apesar do aumento em números absolutos, o percentual de falantes de línguas indígenas em relação à população total de indígenas registrou uma queda em doze anos. Em 2010, eles representavam 37,35% de uma população indígena de cerca de 897 mil pessoas. Já em 2022, embora a população indígena tenha crescido para aproximadamente 1,7 milhão, os falantes de línguas indígenas correspondem a 28,51% desse total. Similarmente, fora das Terras Indígenas, o percentual de falantes caiu de 12,67% para 9,78%, ainda que o número absoluto tenha mais que dobrado. Nas Terras Indígenas, contudo, o cenário é inverso: o percentual de falantes cresceu de 57,35% para 63,22% no mesmo período.

Damasco atribui essa dinâmica a um movimento de valorização e resgate das línguas pelos próprios indígenas. Ele explica que, na última década, foram implementados muitos esforços para garantir que os indígenas pudessem utilizar e reproduzir suas línguas, tanto por meio de políticas linguísticas e educação na língua materna quanto por um forte movimento interno de resgate e valorização do uso da língua.

O Avanço do Português e o Papel da Educação

Os dados também revelam um avanço significativo do português. Em 2022, 1.404.340 pessoas indígenas, ou seja, 86,32% da população indígena do país, utilizavam o português no domicílio. Dentro das Terras Indígenas, 67,14% (394.237) dos indígenas falavam português. O IBGE analisou o progresso do idioma em TIs, observando um aumento superior a 25 pontos percentuais na fala do português em 98 TIs, enquanto em 42 houve uma queda de mais de 25 pontos percentuais. Por outro lado, 55 TIs tiveram variações positivas acima de 25 pontos percentuais no uso de línguas indígenas, indicando que, percentualmente, mais pessoas estão falando essas línguas, ao passo que 27 TIs registraram variação negativa.

Por fim, Damasco enfatiza que a educação e a alfabetização podem, de fato, contribuir para o fortalecimento linguístico. No entanto, ele adverte que isso não deve ser feito exclusivamente em português, sob o risco de as línguas indígenas deixarem de ser faladas nos domicílios. Em outras palavras, “a alfabetização, se for feita de forma a simplesmente incentivar a substituição da língua indígena pelo português, pode ser absolutamente nociva”, defende. Contudo, quando a educação é bilíngue ou ministrada na própria língua indígena, ela contribui consideravelmente para o seu fortalecimento.