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Arte Pop na Ditadura: Resistência em Cores na Pinacoteca

Pinacoteca celebra 120 anos com mostra "Pop Brasil", exibindo 250 obras de mais de 100 artistas que usaram a arte pop para resistir à ditadura militar (1960-1970) no Brasil, revelando a força da arte como forma de contestação política e social.
Arte Pop Ditadura Brasileira
Foto: Levi Fanan/Divulgação

Arte Pop sob a Ditadura: Resistência Colorida na Pinacoteca

A Pinacoteca de São Paulo celebra seu 120º aniversário com uma exposição grandiosa: “Pop Brasil: vanguarda e nova figuração, 1960-1970”. A mostra, que reúne 250 obras de mais de 100 artistas brasileiros, oferece um olhar único sobre a arte pop como ferramenta de resistência durante a ditadura militar (1960-1970). A exposição destaca a arte como potente forma de contestação política e social num período marcado pela ruptura democrática, o surgimento da indústria cultural e profundas transformações sociais, em meio à Guerra Fria.

Uma Curadoria que Revela a Resistência

Com curadoria de Pollyana Quintella e Yuri Quevedo, a exposição explora como artistas brasileiros usaram a linguagem da arte pop – originária do Reino Unido e popularizada por nomes como Andy Warhol e Roy Lichtenstein nos EUA – para desafiar a censura e a opressão. Entretanto, ao contrário do contexto desenvolvido e industrializado dos artistas norte-americanos, a arte pop brasileira refletiu a realidade do subdesenvolvimento, da desigualdade social e da repressão da ditadura.

Segundo Quevedo, em entrevista à Agência Brasil, “Esta é a maior exposição do ano da Pinacoteca, neste ano super importante para o museu, que completa 120 anos. A mostra também celebra os 60 anos de dois grandes marcos da arte contemporânea brasileira: a exposição Opinião 65 e a exposição Propostas 65. Ambas ocorreram um ano após o golpe militar e refletiram a reação coletiva dos artistas à opressão e à supressão de direitos.” A exposição na Pinacoteca, portanto, busca reconstruir o retrato dessa geração de artistas, muitos universitários, que reagiram à ditadura, mas também registraram as transformações sociais e comportamentais da época.

Obras icônicas e a contestação da ditadura

A mostra inicia com o “Happening das Bandeiras”, de 1968, com a participação de artistas como Flávio Motta, Nelson Leirner, Hélio Oiticica, Carmela Gross e Ana Maria Maiolino. Neste evento, tecidos serigrafados com mensagens políticas foram exibidos na Praça General Osório, no Rio de Janeiro, ocupando o espaço público e democratizando o acesso às artes visuais. Destaca-se a emblemática bandeira de Oiticica: “Seja marginal, seja herói”, símbolo de resistência cultural.

Em seguida, um altar dedicado a Roberto Carlos, ícone da Jovem Guarda, criado por Nelson Leirner, introduz uma sequência de obras que retratam a música popular brasileira e o surgimento da indústria cultural. No entanto, o foco central da exposição recai sobre as obras que confrontam diretamente a ditadura militar. Entre elas, fotografias de Evandro Teixeira, falecido em 2024, que registram, por exemplo, a imagem impactante de um estudante sendo perseguido por agentes da ditadura. Além disso, desenhos de presos políticos da coleção Alípio Freire e caricaturas de generais completam a representação da repressão.

Conforme explicou Quevedo à Agência Brasil, “A arte pop, com sua comunicação de massas, foi um meio eficaz de denúncia e protesto contra a ditadura. Sua linguagem internacional ganhou, aqui, a característica específica de reagir e elaborar o regime militar. Uma estratégia recorrente foi a ironia da figura do militar, mostrando sua fragilidade, tão precária quanto a indústria brasileira da época”.

Além da Repressão: Mudanças Sociais e Culturais

Além da denúncia da opressão política, a exposição também aborda as mudanças comportamentais, sociais e culturais do período. Como observou Quevedo, “A política e a opressão do regime atingiram outras esferas da vida. A desconstrução de padrões corporais e comportamentais do final dos anos 60, por exemplo, foi uma reação de liberdade. A opressão conservadora buscava controlar corpos e invadir a individualidade, manipulando-os por meio da tortura. Por outro lado, a ocupação de praças e praias, a liberdade no espaço doméstico, a liberdade sexual e de comportamento também foram formas de protesto contra o regime”.

Finalmente, a mostra inclui réplicas dos Parangolés de Hélio Oiticica, peças originalmente expostas na Opinião 65, no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro. Essas capas, faixas e bandeiras, muitas vezes com frases políticas ou poéticas, transformam o espectador em participante da obra de arte.

A exposição “Pop Brasil: vanguarda e nova figuração, 1960-1970” fica em cartaz na Pina Contemporânea até 5 de outubro, com entrada gratuita aos sábados. Mais informações estão disponíveis no site da Pinacoteca.