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BH cria Dia do Casamento Cristão Monogâmico; advogada vê inconstitucionalidade

Belo Horizonte institui o Dia Municipal do Casamento Monogâmico Cristão em 18 de maio; advogada alega inconstitucionalidade e exclusão de outras formas de família.
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Foto: Marcello Casal JrAgência Brasil

Belo Horizonte instituiu oficialmente o Dia Municipal da Fidelidade Conjugal e do Casamento Monogâmico Cristão, a ser celebrado anualmente em 18 de maio. A medida, publicada no Diário Oficial da cidade em um sábado recente, já provoca debates acalorados e suscita questionamentos sobre sua legalidade. Embora a intenção seja homenagear valores familiares específicos, especialistas em direito apontam que a nova lei pode violar princípios constitucionais fundamentais, como a laicidade estatal e a igualdade, além de promover a exclusão de outras configurações familiares amplamente reconhecidas no país.

A Criação da Nova Data Comemorativa em BH

A iniciativa para a criação desta data partiu de um projeto de lei aprovado pela Câmara Municipal de Belo Horizonte, de autoria do vereador Neném da Farmácia, do partido Mobiliza. O prefeito Álvaro Damião foi o responsável por sancionar a lei, inserindo-a no calendário oficial da capital mineira. De acordo com a justificativa apresentada pelo vereador, a escolha do dia 18 de maio está intrinsecamente ligada ao desejo de ressaltar a importância de valores que, segundo ele, são o alicerce de inúmeras famílias na cidade.

Nesse sentido, a fidelidade conjugal e o casamento monogâmico são apresentados como pilares essenciais para uma convivência familiar saudável, estruturada e duradoura. Além disso, o texto da proposição enfatiza a busca por promover uma reflexão aprofundada sobre o papel fundamental da união estável entre um homem e uma mulher, salientando os benefícios sociais que essa forma de relacionamento supostamente oferece à comunidade em geral. A intenção, portanto, é reforçar uma visão particular de família e de união.

Questionamentos Jurídicos e a Visão da Especialista

Contrariando a perspectiva dos idealizadores da lei, a advogada Bianca Figueira Santos, reconhecida especialista em direitos LGBTQIA+ e direito das famílias, manifestou forte preocupação com a constitucionalidade da nova medida. Segundo a jurista, a lei aprovada no município confronta diretamente a Constituição Federal e, consequentemente, poderá ser contestada judicialmente. Embora aparente ser uma singela homenagem a valores familiares, a advogada argumenta que a legislação fere princípios fundamentais.

Um dos pontos cruciais levantados é a violação da laicidade do Estado, que exige neutralidade religiosa do poder público. Ademais, a lei também comprometeria o princípio da igualdade entre os cidadãos. Ao criar uma data oficial para celebrar exclusivamente o casamento cristão, monogâmico e heterossexual, a cidade de Belo Horizonte, na visão de Bianca Figueira Santos, acaba por marginalizar e desvalorizar outras formas legítimas de família, afeto e fé que coexistem e são plenamente reconhecidas tanto pela sociedade quanto pelo sistema jurídico brasileiro.

O Contexto Legal e o Impacto Social da Exclusão

A advogada ressalta o significativo impacto simbólico e negativo que a instituição desta data pode gerar. Para ilustrar seu argumento, ela lembra que, desde 2011, o Supremo Tribunal Federal (STF) reconhece de forma explícita as uniões estáveis homoafetivas como entidades familiares. Subsequentemente, o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo tornou-se uma realidade jurídica no Brasil, consolidando a inclusão e a diversidade nas configurações familiares.

Portanto, ao celebrar institucionalmente apenas o casamento “entre homem e mulher”, a nova lei, de acordo com Bianca Figueira Santos, reforça uma mensagem de exclusão. Tal medida nega o reconhecimento público a famílias formadas por casais homoafetivos, contrariando abertamente o princípio da igualdade. Consequentemente, essa postura alimenta uma visão discriminatória, sugerindo, de forma implícita, que existiriam famílias “corretas” e outras “ilegítimas”, um conceito que se choca com a jurisprudência e os avanços sociais do país.

Em suma, a criação do Dia Municipal da Fidelidade Conjugal e do Casamento Monogâmico Cristão em Belo Horizonte desencadeou uma controvérsia significativa. A legislação municipal, embora defendida por seus propositores como um reforço de valores, é veementemente criticada por especialistas que apontam para sua inconstitucionalidade e o caráter excludente. Este embate entre tradição e os princípios de inclusão e laicidade garantidos pela Constituição Federal certamente promete desdobramentos, abrindo espaço para um possível questionamento na esfera judicial.