A discussão sobre moradia digna transcende a mera disponibilidade de um teto, englobando também a proximidade essencial de serviços e infraestruturas básicas. Esta é a visão central do professor franco-colombiano Carlos Moreno, da Universidade Paris 1 Panthéon-Sorbonne, que recentemente esteve no Brasil em um evento promovido pelo Instituto Motiva. Segundo Moreno, a ausência de acesso facilitado a elementos como saúde, comércio, lazer e educação nas imediações da residência configura um sério fator de exclusão social, uma realidade particularmente evidente na América Latina.
De fato, a moradia precária não se limita à carência de uma habitação em si, mas se aprofunda na falta de um entorno que ofereça as conveniências diárias necessárias aos cidadãos. O urbanista, por exemplo, enfatiza que cidades que impulsionam seus moradores de baixa renda para as periferias, distantes de qualquer serviço, estão, na verdade, os apartando da vida urbana. Portanto, mesmo com a construção de habitações sociais, se estas forem implantadas em locais isolados, o problema da exclusão persiste e se agrava.
O Conceito da “Cidade de 15 Minutos”
O trabalho de Carlos Moreno centra-se no inovador conceito de “Cidade de 15 Minutos”, que propõe a organização dos bairros de maneira a garantir que os moradores possam satisfazer suas necessidades diárias, como acesso à saúde, comércio, educação e áreas de lazer, a uma curta distância de suas residências. Esta proposta visa, primordialmente, a diminuir a dependência de veículos automotores, contribuindo significativamente para a redução da poluição. Além disso, busca aprimorar a qualidade de vida e o bem-estar dos habitantes, ao passo que fortalece a resiliência das comunidades urbanas.
Moreno defende que residir afastado das áreas centrais, sem o devido acesso a serviços essenciais, é sinônimo de exclusão social. Ele argumenta que o objetivo primordial de seu conceito é transformar o modo de vida nas cidades, assegurando que o tempo dos cidadãos seja empregado de forma útil e digna. Por conseguinte, a inclusão social e econômica se torna um pilar fundamental, promovendo o acesso equitativo a serviços de saúde, educação, comércio, espaços públicos e cultura para todos.
Desafios da Urbanização e Sustentabilidade
O rápido e muitas vezes desordenado aumento da urbanização global tem gerado uma série de problemas, incluindo uma informalidade crescente, a escassez de serviços básicos e, muitas vezes, dificuldades na convivência comunitária. Este cenário é particularmente visível na expansão das grandes metrópoles do Sul Global. O Brasil, por exemplo, ilustra essa dinâmica com um crescimento populacional urbano vertiginoso a partir da década de 1970, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em outras palavras, as cidades brasileiras representam um desafio considerável para a prática da humanidade e da sustentabilidade.
Para Moreno, cidades humanizadas são aquelas que reconhecem e celebram a diversidade de seus habitantes. Por conseguinte, cidades verdadeiramente sustentáveis consideram não apenas a natureza e a biodiversidade, mas também a harmonia social necessária para atravessar os desafios de um mundo crescentemente urbanizado. É fundamental, portanto, que o desenvolvimento urbano seja pautado por princípios de inclusão e equidade.
Soluções para Cidades Sustentáveis e Inclusivas
A construção de cidades sustentáveis requer uma abordagem multifacetada. Entre os elementos que contribuem para esse objetivo, destacam-se as soluções baseadas na natureza, a ampliação de áreas verdes e o incentivo a uma mobilidade de baixo carbono. Renata Ruggiero, presidente do Instituto Motiva, reforça, entretanto, que a sustentabilidade de um território depende intrinsecamente de outros fatores cruciais. Segundo ela, não é possível falar em uma cidade sustentável enquanto se convive com as profundas desigualdades sociais que caracterizam o Brasil. Uma cidade sustentável, portanto, precisa ser inerentemente inclusiva, oferecendo mais oportunidades a seus habitantes para mitigar as disparidades sociais.
Além disso, a qualidade de vida surge como um pilar essencial na edificação de um território mais sustentável. Ruggiero sublinha a importância de criar condições para que as pessoas possam adotar hábitos mais saudáveis e viver de forma mais integrada, por meio de iniciativas nas áreas da saúde e do esporte. Afinal, o bem-estar individual e coletivo está diretamente ligado à capacidade de uma cidade de proporcionar um ambiente saudável e estimulante.
O Modelo Replicável do Instituto Motiva em São Paulo
Em busca de soluções concretas, o Instituto Motiva selecionou o bairro de Presidente Altino, localizado na divisa entre a capital paulista e Osasco, para a implementação de uma estratégia social. Este projeto piloto, focado em cidades e comunidades sustentáveis, envolve uma ampla coalizão territorial. Além do próprio Instituto Motiva, a iniciativa mobiliza empresas, organizações da sociedade civil presentes no território, o poder público e, crucialmente, a população local. A ideia central, ademais, é que todo o processo – desde a concepção até a governança contínua – seja devidamente sistematizado. Essa metodologia de urbanismo social desenvolvida no bairro paulistano visa, em seguida, contribuir para a formulação de políticas públicas eficazes para outras cidades.
Em parceria com o Centro de Estudos das Cidades – Laboratório Arq.Futuro, o processo de sistematização será detalhado, transformando-o em um modelo replicável. Como Renata Ruggiero ressalta, este é um caminho que pode ser reproduzido em diversos outros territórios, envolvendo a participação de todos os atores sociais. Frequentemente, as transformações e impactos urbanos são menos potentes devido à falta de articulação entre os múltiplos agentes envolvidos. Em conclusão, a proposta não se restringe aos benefícios locais; ela tem a ambição de influenciar a formulação de políticas públicas em uma escala mais ampla.
Este projeto de inovação social e a coalizão territorial que se inicia têm como objetivo primordial a implementação de ações e iniciativas para o desenvolvimento local. Entretanto, ele também possui uma visão mais abrangente: ser um farol para o desenvolvimento urbano em todo o país. Ao todo, vinte territórios – incluindo cidades e comunidades – foram escolhidos pela instituição para receber intervenções que visam à promoção de espaços mais sustentáveis. Estes estão distribuídos pelos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Bahia, Paraná e Mato Grosso do Sul. Inicialmente, esses locais serão submetidos a um diagnóstico aprofundado, seguido pela elaboração de planos de desenvolvimento territorial específicos, garantindo uma abordagem personalizada e eficaz.