No coração da Ilha de Marajó, no Pará, comunidades rurais estão promovendo uma transformação significativa ao trocar métodos agrícolas predatórios por práticas sustentáveis. Anteriormente, o fogo frequentemente devastava a vegetação, contudo, atualmente, a regeneração florestal e a produção sustentável impulsionam o sustento de inúmeras famílias, sobretudo com o apoio de um projeto inovador. Dessa forma, a adoção da agrofloresta não apenas revitaliza as terras, mas também fortalece a economia local.
A Agrofloresta Transforma Propriedades em Salvaterra
Na Vila de Monsarás, localizada em Salvaterra, o agricultor e pescador Ronildo Pacheco exemplifica essa mudança. Ele, portanto, conseguiu revolucionar a produtividade de suas terras por meio do Sistema Agroflorestal (SAF), uma técnica que combina harmoniosamente a produção agrícola com o reflorestamento. A princípio, Ronildo dedicava seus quatro hectares no Sítio Retiro Emanuel exclusivamente ao cultivo de abacaxi. No entanto, hoje sua propriedade exibe uma diversidade impressionante.
Atualmente, durante a safra, Ronildo colhe impressionantes quinhentos quilos de açaí diariamente. Além disso, ele cultiva acerola, taperebá, cacau, milho e mandioca, demonstrando a versatilidade do SAF. O agricultor emprega técnicas naturais, como o sombreamento entre diferentes espécies e a utilização de caroços de açaí secos como adubo, processo conhecido como coroamento. Consequentemente, essas práticas minimizam drasticamente o impacto ambiental.
Ronildo explica que a agrofloresta representa um avanço em comparação com a agricultura tradicional. Ele observa que “quem planta abacaxi de forma convencional precisa preparar a terra e queimar a mata a cada ano, pois não há maquinário para arar o solo. A agrofloresta, por outro lado, permite o plantio contínuo no mesmo local, sem a necessidade do fogo”. Ele ainda destaca os benefícios financeiros: “Ela gera renda durante mais tempo ao longo do ano, pois o abacaxi só produz uma vez. Assim, em vez de uma monocultura, eu consigo ter até cinco colheitas anuais”, afirma o produtor.
Inovação e Engajamento Comunitário Impulsionam o Desenvolvimento
Essa transformação foi viabilizada pelo Projeto Sustenta e Inova, uma iniciativa conjunta do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) e da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), que recebe financiamento da União Europeia. Ronildo, junto com outras 30 famílias da região, integra a Cooperativa Agropecuária e de Pesca Artesanal de Monsarás (COOPAPAM). Este grupo, primeiramente, dedica-se à recuperação de áreas degradadas por queimadas e, posteriormente, trabalha na conscientização de outros produtores que ainda resistem à adoção de novos modelos agrícolas.
A nova abordagem, aliás, tem inspirado até mesmo as novas gerações. Jamile Pacheco, filha de Ronildo, com 18 anos, atua como secretária e guia de turismo na propriedade familiar. Ela cursa secretariado na Universidade Federal do Pará (UFPA) e, dessa forma, utiliza seus conhecimentos para aprimorar a divulgação do trabalho local e dos benefícios inerentes à agrofloresta.
Jamile expressa sua satisfação com os resultados: “Desde a época do meu avô, a terra era muito queimada para plantar abacaxi, o que prejudicava bastante o meio ambiente. Com essa mudança, entretanto, agora temos mais sombra e nutrientes para o solo. Estou realmente feliz com o que construímos aqui”, declara a jovem, evidenciando o impacto positivo na família e no ecossistema.
O Açaí: Um Símbolo da Mudança e os Desafios da Colheita
O açaí emergiu como o principal produto e símbolo dessa transição para o sistema agroflorestal na fazenda de Ronildo. Este fruto é crucial tanto para os hábitos alimentares locais quanto para a comercialização em outros mercados brasileiros. Durante o período de colheita, que se estende por aproximadamente seis meses, de julho a janeiro, moradores de comunidades vizinhas chegam para participar do trabalho.
Walter Antônio dos Santos Barbosa, de 52 anos, pescador e agricultor, é um desses colaboradores. Ele descreve a intensidade da tarefa: “É um trabalho pesado; em um único dia, uma pessoa pode subir mais de 30 árvores para retirar um cacho de açaí”. Walter, conhecido carinhosamente como Coroa, brinca sobre o esforço: “É bom porque a gente faz muito exercício para o corpo, mas é cansativo e não dá para ter preguiça. As pessoas que consomem açaí precisam valorizar esse trabalho. Muitos acham caro quando veem a cumbuca a R$ 18, mas nem imaginam todo o processo por trás”, ressalta.
Superando Obstáculos: A Urgência por Investimento em Irrigação
Apesar dos sucessos, uma das maiores dificuldades para expandir o cultivo de açaí e persuadir mais agricultores a adotarem a agrofloresta reside na carência de investimentos em sistemas de irrigação. Ronildo, por exemplo, enfatiza a dependência crucial da água: “Sem água, não conseguimos realizar nosso trabalho. A maioria dos agricultores daqui não possui poços”.
Ele prossegue, explicando seus esforços: “Consegui estabelecer parcerias com outras empresas e patrocinadores para instalar sistemas de irrigação em cinco poços, e mais sete estão a caminho. No entanto, para alcançar o ideal, ainda falta bastante”. Ronildo ainda alerta para uma perspectiva preocupante: “Se não resolvermos isso, chegará um dia em que faltará açaí para alimentar a população daqui e de outros lugares”, o que sublinha a importância crítica de soluções para a escassez hídrica na região.