Dentro de um mês, a atenção global se voltará para a região Norte do Brasil, mais especificamente para a Amazônia, que sediará a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30). A capital paraense, Belém, receberá o evento de 10 a 21 de novembro, com a expectativa de reunir delegações governamentais e representantes da sociedade civil de todo o mundo. O Brasil, na posição de presidência da conferência, assume a crucial responsabilidade de conduzir os debates e forjar consensos diante dos urgentes desafios climáticos que o planeta enfrenta.
Os Preparativos e o Contexto Global da COP30
Enquanto Belém se ajusta em termos de infraestrutura, logística e acomodações para receber os milhares de participantes, especialistas e negociadores brasileiros trabalham intensamente. O objetivo principal é alcançar acordos que contribuam para a preservação do meio ambiente e o bem-estar das populações. Neste cenário, a voz da ciência ganha destaque, com especialistas solicitando maior poder decisório nas discussões da COP30.
No decorrer da última semana, Aloisio Lopes de Melo, secretário Nacional de Mudança do Clima do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima e uma das figuras centrais do governo brasileiro na área, delineou os principais desafios e as pautas prioritárias do país na presidência. Ele participou de um encontro relevante com representantes de instituições científicas na sede da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), localizada no Rio de Janeiro. Na ocasião, Melo ressaltou a enorme responsabilidade que o governo brasileiro carrega ao presidir a conferência em um momento tão crítico para o clima global. Além disso, os cientistas presentes reivindicaram uma participação mais ativa e influente da comunidade científica nas decisões da COP30.
Aloisio Melo, que também colabora na elaboração do Plano Clima — a política nacional de enfrentamento às mudanças climáticas com ações previstas para o período de 2024 a 2035 — oferece uma perspectiva detalhada sobre os múltiplos desafios que a presidência brasileira enfrentará.
Prioridades e Obstáculos na Liderança Brasileira
Reforçando o Multilateralismo
Na avaliação de Aloisio Melo, o Brasil assume a presidência da COP30 em um cenário global “bastante complexo”, marcado por conflitos políticos e bélicos. Por conseguinte, ele identifica o fortalecimento do multilateralismo como o primeiro e mais significativo desafio. Melo enfatiza a necessidade de reafirmar a estrutura multilateral, como o Acordo de Paris, que visa limitar o aumento da temperatura global a 1,5° Celsius acima dos níveis pré-industriais, como um instrumento essencial e eficaz para combater as mudanças climáticas.
Adicionalmente, o secretário argumenta que é imperativo demonstrar a importância de um esforço coordenado internacionalmente para enfrentar a crise climática. Ele observa que o sistema multilateral tem sofrido ataques, e esta COP deve provar sua capacidade de oferecer respostas concretas e de promover ações efetivas.
A Ambição Climática das Nações
Um segundo desafio crucial, conforme Melo, reside na ambição dos países. Ele explica que a base do Acordo de Paris se apoia nas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs), compromissos voluntários que as nações apresentam para manter a trajetória de aquecimento limitada a 1,5°C. Portanto, a efetividade do acordo depende tanto da apresentação desses compromissos quanto de sua suficiência para guiar o mundo a esse patamar.
Até o momento, aproximadamente 50 nações entregaram suas NDCs, enquanto cerca de 100 outras, embora não formalmente, já apresentaram seus compromissos. Historicamente, o Acordo de Paris enfrentou um revés quando, em 2025, o então presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou a saída do país do tratado. No entanto, o Brasil, por sua vez, revisou sua Política Nacional sobre Mudança do Clima para alinhar seus compromissos ao Acordo de Paris, almejando emissões líquidas zero de gases do efeito estufa até 2050.
Engajamento do Setor Privado e o Financiamento Climático
Melo também destaca o papel fundamental do setor privado. Nele, a inovação voltada para a descarbonização já se consolidou como um direcionador estratégico em diversas indústrias e setores. Ele afirma que as métricas estão claras e que as estratégias e a agenda tecnológica já se encontram bastante definidas. Esse encontro entre os mundos público e privado, por conseguinte, sinaliza um movimento positivo e colaborativo em direção à ação climática.
Outro desafio de grande magnitude é o financiamento climático, que exige a mobilização de impressionantes US$ 1,3 trilhão até 2035 — valores que o secretário descreve como “bastante astronômicos”. Diversos atores estão empenhados nesta busca por recursos, incluindo discussões com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e seus homólogos de outros países. Entretanto, Melo levanta uma questão crucial: qual parcela desse montante será efetivamente destinada à pesquisa, desenvolvimento, inovação e, sobretudo, à implementação de medidas para auxiliar os países em desenvolvimento?
Adaptação: Uma Agenda Central
A COP30, segundo o secretário nacional, representará um marco ao abordar “seriamente” a questão da adaptação às mudanças climáticas, uma pauta que a presidência brasileira estabeleceu como prioritária. Ele descreve a adaptação como uma agenda rica em informações e conhecimento, também prioritária no Plano Clima brasileiro. Consequentemente, a expectativa é que a conferência consiga aprovar um arcabouço de indicadores de adaptação. A equipe brasileira, vale ressaltar, integrou o grupo internacional que propôs 100 indicadores globais de adaptação, esperando que essa proposta, se aprovada, sirva como referência para os países a partir de agora.
Transição Energética Justa
A transição energética é classificada por Aloisio Melo como um dos temas mais sensíveis e complexos da COP30. Ele recorda o acordo entre os países para se afastar dos combustíveis fósseis, triplicar o uso global de energias renováveis e dobrar a eficiência energética. A perspectiva do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima é que esta COP deve traçar um caminho claro para que os países definam um roteiro detalhado para alcançar o uso zero ou mínimo possível de combustíveis fósseis. Ademais, Melo apela por um acordo internacional que inclua indicadores para tratar questões socioeconômicas e fiscais relevantes.
O secretário pondera que países produtores, como o Brasil, dependem dessa receita para o equilíbrio governamental, o que tem impacto macroeconômico e distributivo. Contudo, ele é categórico: se não endereçarmos essa questão, responsável por 70% das emissões globais, não estaremos falando seriamente sobre o enfrentamento da mudança do clima.
Combate ao Desmatamento e Preservação dos Oceanos
A questão do desmatamento e da degradação florestal também receberá atenção especial na COP30. Melo menciona o Fundo Tropical das Florestas (TFFF), que atua como uma forma de recompensa para países que preservam suas florestas tropicais, com o Brasil atuando como aportador nesse fundo.
Posteriormente, o secretário chama a atenção para a necessidade de adquirir novos conhecimentos, citando como exemplo os oceanos. Ele afirma que o tema dos oceanos ganhou relevância considerável ao longo do tempo, inclusive sob a ótica da ação climática. Entretanto, ainda persistem muitas demandas para compreender melhor a interação complexa entre oceano e clima, os fenômenos que ocorrem nos ecossistemas marinhos e seus potenciais impactos tanto para o sistema climático quanto para as sociedades humanas.
Em conclusão, a presidência brasileira da COP30 se depara com uma agenda ambiciosa e multifacetada, que exige diplomacia, inovação e a capacidade de unir nações em um propósito comum. A conferência em Belém, na Amazônia, será um palco decisivo para o futuro da ação climática global, com o Brasil no centro dos esforços para moldar as respostas aos desafios mais prementes do nosso tempo.