Edição Brasília

Após 10 anos, 4 mil mulheres reúnem-se em Brasília por igualdade e democracia

Milhares de mulheres se reúnem em Brasília para a 5ª Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres, que retoma, após quase uma década, debates cruciais por igualdade e democracia.
5ª Conferência Mulheres Políticas
Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

Brasília tornou-se, a partir de hoje (29), o palco da 5ª Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres (5ª CNPM), que reúne cerca de 4 mil mulheres para debater e construir agendas cruciais em prol da igualdade e da democracia no Brasil. Este encontro, sob o tema “Mais Democracia, Mais Igualdade, Mais Conquistas para Todas”, marca a retomada de um espaço fundamental de participação social após um hiato de quase uma década. Coordenada pelo Ministério das Mulheres (MMulheres) e pelo Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM), a conferência se estenderá até quarta-feira (1º), prometendo um intenso intercâmbio de ideias e propostas.

O Retorno de um Espaço Democrático

Após um período de interrupção que durou quase dez anos, a realização da 5ª CNPM representa um marco significativo para o movimento de mulheres no país. A ministra das Mulheres, Márcia Lopes, em entrevista à Agência Brasil, enfatizou a importância desta retomada. Ela relembrou que, após a 4ª Conferência em 2016, o governo subsequente promoveu uma desmobilização e desautorização das relações democráticas e federativas. Consequentemente, houve um desfinanciamento das políticas públicas, a extinção de ministérios essenciais e o cerceamento da participação social, com uma clara intenção de desmantelar as conferências e conselhos.

Nesse sentido, a ministra ressaltou que a atual edição ocorre em um contexto político profundamente diferente, marcado pela criação do Ministério das Mulheres em 2023. Isso, segundo ela, sinaliza uma posição governamental que prioriza as mulheres e suas pautas, invertendo o cenário de “silenciamento coletivo” vivenciado anteriormente. Portanto, a conferência não é apenas um evento, mas um símbolo da reconstrução democrática e do compromisso com os direitos femininos.

Mobilização Abrangente e Temas Centrais

A etapa nacional da conferência é o culminar de uma vasta mobilização que percorreu o país desde abril. Milhares de participantes, incluindo delegadas, convidadas, observadoras, representantes da sociedade civil e expositores da feira de economia solidária, chegam a Brasília carregadas de expectativas e propostas. Além disso, a pauta de debates é abrangente, abordando desde o enfrentamento às desigualdades sociais, econômicas e raciais até o combate à violência contra as mulheres. Outrossim, temas como o aumento da representatividade feminina em espaços de poder, o fortalecimento de políticas de cuidado e autonomia econômica, saúde, educação e assistência social, o fim da escala de trabalho 6×1 e os direitos reprodutivos também ocupam lugar de destaque na discussão.

Márcia Lopes detalhou o processo de construção coletiva do evento, que incluiu quase mil conferências livres, organizadas por grupos diversos como jornalistas, idosas, mulheres com deficiência, negras, quilombolas e LGBTs. Somente das conferências livres, cerca de 1,3 mil mulheres se somam às representantes enviadas por municípios e estados. Em suma, a ministra celebrou a mobilização e a “identidade do país” que se manifestou nas conferências estaduais, com mulheres de todos os segmentos e setores presentes. Em suas palavras, a 5ª Conferência já se consagra como vitoriosa pela motivação e busca por agendas comuns que respondam à vida das mulheres, seja no protagonismo, participação ou enfrentamento às violências.

Desafios e Expectativas para Políticas Públicas

A implementação de políticas públicas eficazes para as mulheres no Brasil enfrenta desafios consideráveis, conforme apontado pela Ministra Márcia Lopes. Primeiramente, o tamanho continental do país e a necessidade de respeitar as diferenças regionais e o pacto federativo exigem um esforço coordenado. Para tanto, a ministra enfatiza a importância de que lideranças parlamentares e do Executivo abracem unanimemente a causa das mulheres, garantindo que as propostas da política nacional sejam implementadas de forma coletiva. Por outro lado, a relação entre o Estado, a sociedade civil e o setor empresarial também se mostra crucial para o avanço dessas pautas.

Entre os temas mais debatidos na conferência, Márcia Lopes mencionou a Lei da Igualdade Salarial, cuja aplicação pronta pelo setor privado poderia gerar maior autonomia econômica para as mulheres. Ademais, o desafio orçamentário se impõe, visto que a correlação de forças no Congresso, com a instituição do orçamento secreto e das emendas impositivas, exige mais negociação e pressão social para a alocação adequada de recursos. Outro ponto relevante é a regulamentação da Política Nacional de Cuidados, que visa integrar diversas áreas como saúde, educação e assistência social, inclusive com a sugestão de “cuidotecas” em universidades para mulheres estudantes. A ministra defendeu a universalização do Programa Nacional de Saúde Mental e a escalabilidade das políticas públicas existentes para alcançar todas as mulheres brasileiras, das grandes capitais aos municípios menores.

Combate à Violência e Melhoria das Condições de Trabalho

Na busca pela redução da violência de gênero e a erradicação do feminicídio, a Rede de Proteção à Mulher coordenada pelo Ministério das Mulheres desempenha um papel vital. A ministra destacou o programa da Casa da Mulher Brasileira, que integra serviços essenciais como Ministério Público, Defensoria Pública, Patrulha Maria da Penha e delegacias, além de contar com equipes de assistentes sociais, psicólogos e advogados para acolhimento. Contudo, a expansão e manutenção dessas estruturas demandam recursos significativos, e a efetiva execução da Lei Maria da Penha é vista como fundamental para resultados positivos.

A conferência também discute a precarização do trabalho e o cumprimento da Lei da Igualdade Salarial. Márcia Lopes reiterou que as mulheres têm plena capacidade de integrar o desenvolvimento econômico e social do país, e a igualdade salarial é uma demanda inegociável. Para além disso, ela enfatizou a necessidade de mobilizar a sociedade e o empresariado para garantir condições de trabalho adequadas, como licença-maternidade, espaços de cuidado nas empresas e segurança contra assédio moral e sexual. A ministra lamentou que as mulheres, além de suas responsabilidades, ainda precisem se preocupar com proteção e violência no ambiente de trabalho.

A Pluralidade de Vozes e o Futuro

A pluralidade de vozes emerge como o grande trunfo da 5ª Conferência. Márcia Lopes expressou seu encantamento com as 4 mil mulheres reunidas, descrevendo a “garra” e a “gana de participação” observadas em todo o país. Ela salientou que, apesar das inferiorizações e explorações, as mulheres encontram força na solidariedade coletiva, defendendo não apenas a si mesmas, mas suas famílias, comunidades e o país. O Ministério das Mulheres, por sua vez, abraça essa diversidade, promovendo fóruns para pescadoras, quebradoras de coco-babaçu, mulheres LGBTs, trans, idosas, pessoas com deficiência, indígenas, rurais, empresárias e sindicalistas, entre outras. A ministra acredita que essa riqueza de perspectivas fortalecerá um projeto de nação mais inclusivo.

Em conclusão, as propostas aprovadas durante a 5ª CNPM servirão de base para a construção de um Plano Nacional de Políticas para as Mulheres atualizado. Este plano, segundo Márcia Lopes, será um documento democrático que defenderá a soberania do país, a autonomia das mulheres e sua participação em todos os campos do conhecimento e do futuro. A conferência culminará com a deliberação dessas propostas em uma plenária final, após dias de painéis temáticos, espaços de diálogo, atividades culturais, feira de economia solidária e tendas de debates sobre justiça climática e de gênero. A abertura oficial, que conta com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e de outras autoridades, reforça o compromisso institucional com as pautas femininas.