Edição Brasília

Criador de cidades-esponja e mais três morrem em queda de avião no MS

O arquiteto chinês Kongjian Yu, criador das "cidades-esponja", e mais três pessoas morreram em queda de avião em Aquidauana (MS) na terça-feira (23).
Kongjian Yu cidades-esponja acidente
Foto: Ascom | CAU/BR

Quatro pessoas, incluindo o renomado arquiteto chinês Kongjian Yu, faleceram em um trágico acidente aéreo em Aquidauana, Mato Grosso do Sul, na última terça-feira, dia 23. Yu, amplamente reconhecido como o idealizador do conceito de “cidades-esponja”, estava entre as vítimas da queda da aeronave de pequeno porte, que ceifou a vida de outros três indivíduos, deixando a comunidade de urbanistas e a indústria cinematográfica em luto.

Detalhes da Tragédia Aérea no Pantanal

O acidente ocorreu no final da tarde de terça-feira, em Aquidauana, localizada a aproximadamente 150 quilômetros da capital Campo Grande. A bordo do Cessna Aircraft 175, prefixo PT-BAN, estavam, além de Kongjian Yu, de 62 anos, o piloto Marcelo Pereira de Barros, de 59 anos, proprietário da aeronave. Além disso, a tragédia vitimou o cineasta Luiz Ferraz, de 42 anos, e o diretor de fotografia Rubens Crispim Jr., de 51 anos, ambos profissionais destacados no cenário audiovisual brasileiro. A perda de figuras tão influentes em suas respectivas áreas gerou um grande impacto nacional e internacional.

Andamento das Investigações

Com efeito imediato ao acidente, investigadores do 4º Serviço Regional de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (SERIPA IV) foram acionados e estiveram no local. Ademais, a equipe procedeu com a coleta meticulosa de materiais e informações cruciais, visando elucidar as causas da fatalidade. A Força Aérea Brasileira (FAB) informou que, embora ainda não seja possível determinar prazos definitivos, a investigação será concluída no menor tempo praticável, considerando a complexidade do ocorrido. O Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), por sua vez, divulgará um relatório detalhado com suas descobertas e conclusões. É importante salientar que o propósito principal da investigação não é atribuir culpas ou responsabilidades, mas sim identificar fatores contribuintes para evitar futuras ocorrências similares, fortalecendo a segurança aérea.

O Projeto “Planeta Esponja” e a Missão no Pantanal

A viagem do grupo tinha um propósito específico e de grande relevância cultural. Luiz Ferraz e Rubens Crispim Jr. estavam em plena produção de um documentário ambicioso, intitulado “Planeta Esponja”, que tinha como foco principal o trabalho inovador de Kongjian Yu. Thomas Miguez, produtor-executivo da Olé Produções, empresa fundada por Ferraz, esclareceu que a visita do professor Yu ao Brasil inicialmente se deu por convite da 14ª Bienal Internacional de Arquitetura de São Paulo. No entanto, por estarem já imersos na produção do filme, a ida ao Pantanal surgiu de um pedido especial do próprio Yu, que nutria o desejo de conhecer a riqueza natural da região sul-mato-grossense, que até então lhe era desconhecida.

Anteriormente à sua fatídica viagem ao Pantanal, o arquiteto chinês, que também lecionava na Universidade de Pequim, teve uma agenda movimentada no Brasil. Ele ministrou a conferência de abertura da 14ª Bienal Internacional de Arquitetura de São Paulo, evento que ocorreu entre 18 e 19 de outubro, abordando seu célebre conceito de cidades-esponja. Duas semanas antes, em setembro, Yu também participou ativamente da conferência internacional do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU 2025), realizada em Brasília, onde compartilhou sua visão transformadora para o urbanismo.

Pioneirismo de Kongjian Yu: O Conceito de Cidades-Esponja

Kongjian Yu era uma figura proeminente no urbanismo mundial, aclamado por sua abordagem ecológica no planejamento urbano. Seu conceito de “cidades-esponja” propõe o uso inteligente de soluções baseadas na natureza para aumentar a resiliência de centros urbanos frente a condições climáticas extremas, como inundações. Em outras palavras, ele visava integrar a paisagem natural ao desenho das cidades, transformando-as em ecossistemas capazes de absorver e gerenciar o excesso de água pluvial. Ele relatou que sua inspiração para as cidades-esponja surgiu ao observar as recorrentes inundações em sua aldeia natal, na província chinesa de Zhejiang, e a maneira como a “infraestrutura cinza” — o avanço do concreto nas cidades — agravava os problemas, impermeabilizando vastas áreas e canalizando rios. Consequentemente, seus projetos paisagísticos priorizavam áreas alagáveis e vegetação nativa, permitindo que a cidade funcionasse como uma esponja, absorvendo inundações e mitigando danos, redefinindo a enchente de inimiga a um elemento gerenciável.

Reconhecimento Internacional e Legado Duradouro

Por sua visão inovadora, Yu recebeu diversos dos mais importantes prêmios de sua área, como o IFLA Sir Geoffrey Jellicoe Award (2020), o Cooper Hewitt National Design Award (2023) e o RAIC International Prize (2025). Mais recentemente, a revista Forbes o incluiu na lista dos 50 líderes globais em sustentabilidade, ao lado de nomes como a ministra Marina Silva, evidenciando seu impacto global. Ainda mais notavelmente, Yu esteve no Brasil em junho de 2024, a convite do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Na ocasião, ele participou de um seminário no Rio de Janeiro sobre reconstrução de cidades após desastres ambientais, contexto especialmente pertinente em vista das enchentes que assolaram o Rio Grande do Sul. Durante o evento, o arquiteto expressou a aspiração de que o Brasil se tornasse um modelo global para a construção de um mundo sustentável, compartilhando com orgulho sua experiência sobre a sustentabilidade do planeta.

Notas de Pesar e Homenagens

A Olé Produções, através de uma nota oficial, confirmou as mortes dos quatro indivíduos, expressando profundo pesar pela perda de seus fundadores e colaboradores, além do professor Yu. O Ministério da Cultura também manifestou seu lamento pelo falecimento de Luiz Ferraz, enfatizando sua dedicação aos documentários e a busca incessante por novas linguagens audiovisuais. Em síntese, a pasta sublinhou que sua obra representa uma contribuição inestimável para a cultura e o cinema brasileiro. Da mesma forma, o Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU) emitiu uma nota de pesar, destacando que a contribuição de Yu influenciou políticas públicas ambientais na China e em diversos outros países. O CAU lembrou a participação do arquiteto na conferência de Brasília, onde ele apresentou o conceito de cidades-esponja a cerca de quatro mil profissionais, defendendo soluções baseadas na natureza para enfrentar as enchentes urbanas e os desafios da crise climática. A entidade concluiu que o fundador do premiado escritório Turenscape deixa um legado de compromisso com a sustentabilidade, a paisagem e a vida urbana, um impacto que certamente perdurará.