O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, alertou nesta segunda-feira (22), em São Paulo, que a sustentabilidade das contas públicas e a formulação da política fiscal não são responsabilidades exclusivas do Ministério da Fazenda ou do Poder Executivo. Ele enfatizou, na ocasião, que o equilíbrio orçamentário também enfrenta consideráveis pressões oriundas de decisões do Judiciário e de ações do Congresso Nacional, como a expansão de emendas parlamentares e precatórios, impactando diretamente o Orçamento federal.
Pressões do Judiciário e Legislativo no Orçamento
De acordo com o ministro Haddad, o crescimento expressivo das emendas parlamentares e, similarmente, dos precatórios – que representam dívidas judiciais da União – tem exercido uma forte pressão sobre as finanças governamentais. Com efeito, Haddad recordou a criação de um grupo de trabalho dedicado a manter contato constante com o Judiciário, visando esclarecer o impacto financeiro que certas decisões judiciais podem provocar no orçamento da nação.
Por exemplo, o ministro destacou a relevância das emendas parlamentares, que somam aproximadamente R$ 50 bilhões. Além disso, os precatórios, mesmo não sendo uma decisão tomada pelo governo atual, praticamente dobraram de tamanho. Anteriormente, a média anual dos precatórios oscilava entre R$ 50 bilhões e R$ 60 bilhões; atualmente, entretanto, esse valor alcança a marca de R$ 100 bilhões, conforme declarado pelo ministro durante o evento Macro Day, promovido pelo banco BTG Pactual.
A Tese do Século e seus Impactos Bilionários
Em seguida, Haddad expressou sua preocupação com a chamada “Tese do Século”, uma decisão judicial que permitiu às empresas excluírem o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), principal imposto estadual, da base de cálculo das contribuições federais PIS/Cofins. Consequentemente, essa medida gerou um “tombo” substancial na arrecadação.
O ministro estimou que essa decisão do Supremo Tribunal Federal, aprovada por um placar apertado de 6 a 5, resultou em uma perda de arrecadação superior a R$ 1 trilhão. Ele acrescentou, ainda, que cerca de 10% do Produto Interno Bruto (PIB) da dívida pública brasileira pode ser atribuída diretamente a essa sentença, ressaltando o gravíssimo impacto fiscal sobre o país.
Despesas Herdadas e O Desafio da Sustentabilidade
Adicionalmente, Haddad apontou que uma parte significativa dos gastos governamentais atuais, equivalentes a 0,5 ponto percentual do PIB, provém da expansão de despesas permanentes contratadas ainda na gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro. Essas despesas são, em particular, resultado de modificações no Benefício de Prestação Continuada (BPC) e no Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb).
Essas obrigações, que somam aproximadamente R$ 70 bilhões, representam um encargo considerável para a administração atual. O ministro esclareceu que o governo de hoje não é o responsável direto por esses gastos, mas está honrando compromissos financeiros estabelecidos em 2021, dos quais não conseguiu se desvincular.
Portanto, Fernando Haddad defendeu a necessidade de criar condições políticas robustas para fortalecer o arcabouço fiscal. Isso implica, sobretudo, ampliar o diálogo com o Congresso Nacional. Ele salientou que, para garantir a sustentabilidade do arcabouço a longo prazo, é fundamental que o governo e os parlamentares se reúnam para ajustar algumas regras essenciais.
A Rejeição à “Fúria Arrecadatória”
Por outro lado, o ministro rechaçou veementemente as críticas de que o governo estaria apenas focado em aumentar impostos ou em uma “fúria arrecadatória”. Ele argumentou que uma verdadeira “fúria arrecadatória” ocorreu, de fato, durante o período da ditadura militar, quando a carga tributária brasileira, em proporção ao PIB, elevou-se de 16% para 26%.
Haddad defendeu que a situação atual difere drasticamente desse passado. Segundo ele, as ações presentes visam recompor recursos perdidos ao longo de duas décadas. O objetivo primordial é atingir um patamar em que seja possível controlar as despesas e, assim, reconstituir a base fiscal para garantir a sustentabilidade econômica. Portanto, o ministro negou categoricamente tanto uma suposta “gastança” por parte do governo atual quanto uma “fúria arrecadatória”, como alguns críticos tentam argumentar.
O Legado Projetado para a Economia Brasileira
Finalmente, Fernando Haddad expressou seu firme propósito de entregar um Brasil em melhores condições ao deixar o Ministério da Fazenda. Ele previu que o legado do governo Lula na esfera econômica será inegavelmente positivo para o país e, consequentemente, para as futuras gerações. Entre os marcos projetados, o ministro listou:
- O melhor crescimento médio dos últimos 12 anos ou mais;
- A menor inflação registrada em um mandato desde o Plano Real;
- A menor taxa de desemprego da série histórica;
- O melhor desempenho fiscal dos últimos três mandatos; e
- A maior reforma tributária já implementada sob qualquer regime político.
O ministro enfatizou seu desejo de concluir sua gestão da mesma forma que encerrou todos os cargos que ocupou: com a capacidade de dialogar abertamente sobre o Brasil e seus rumos. Ele aspira discutir a melhoria do grau de investimento, o volume de investimentos, o aprimoramento das contas públicas, a distribuição de recursos para quem mais precisa e a busca por maior justiça tributária em um país marcado pela desigualdade. Haddad concluiu, assegurando que, independentemente de acertos ou erros que a história julgará, todo o trabalho foi feito com tenacidade e grande vontade, esperando colher os frutos de um esforço contínuo na condução da economia.