A maior floresta tropical do planeta, a Amazônia, perdeu uma vasta área equivalente ao tamanho da França nas últimas quatro décadas, segundo um relatório recente. Entre 1985 e 2024, o bioma registrou a supressão de 52 milhões de hectares de vegetação nativa, uma diminuição alarmante que o aproxima perigosamente de um ponto de não retorno ecológico, impulsionado pela intensificação da ocupação humana.
Avanço da Devastação na Amazônia: Um Alerta Crítico
A maneira como a humanidade tem interagido com a Amazônia nos últimos 40 anos acelerou drasticamente a ameaça à capacidade da floresta de contribuir para o equilíbrio climático global. Dados da série histórica do MapBiomas sobre o uso do solo, divulgados nesta segunda-feira, dia 15, revelam essa perda substancial de vegetação nativa.
Essa área convertida para atividades humanas no período representa 13% de todo o território amazônico. Além disso, somando-se às perdas anteriores, a Amazônia já havia perdido 18,7% de sua cobertura vegetal nativa até 2024; desse total, 15,3% foram diretamente impactados por atividades antrópicas. Consequentemente, a floresta encontra-se à beira de um limiar crítico.
Nesse contexto, Bruno Ferreira, pesquisador do MapBiomas, adverte que “a Amazônia brasileira está se aproximando da faixa de 20% a 25% prevista pela ciência como o possível ponto de não retorno do bioma, a partir do qual a floresta não consegue mais se sustentar”. Portanto, a velocidade da transformação do uso da terra é um fator que merece atenção especial.
Os pesquisadores notam uma aceleração impressionante na conversão da cobertura do solo nas últimas quatro décadas. De fato, 83% da supressão total da vegetação nativa ocorreu nesse período. Durante esse tempo, as exuberantes áreas verdes cederam lugar a diversas atividades, como a expansão da pecuária, a agricultura intensiva, a silvicultura de espécies exóticas e, por fim, a mineração.
Expansão Agrícola e Pecuária: Os Motores da Mudança
O avanço das pastagens ilustra claramente essa tendência de desmatamento. Em 1985, por exemplo, a pecuária ocupava 12,3 milhões de hectares na Amazônia; contudo, em 2024, essa modalidade de uso do solo já abrangia 56,1 milhões de hectares do bioma. A agricultura, por sua vez, demonstrou um crescimento ainda mais acentuado.
De uma modesta extensão de 180 mil hectares no início da série histórica, a área ocupada pela agricultura saltou para expressivos 7,9 milhões de hectares em 2024, representando um aumento de 44 vezes. Posteriormente, a silvicultura exótica no bioma experimentou um crescimento proporcionalmente ainda maior, expandindo-se 110 vezes.
Dessa forma, a silvicultura passou de 3,2 mil hectares para 352 mil hectares no mesmo período. A mineração também seguiu uma curva ascendente notável. Conforme os dados, a atividade aumentou de 26 mil hectares para 444 mil hectares nas últimas quatro décadas, evidenciando uma pressão crescente sobre os recursos naturais da região.
O Desafio da Moratória da Soja
Um aspecto crucial que merece destaque é a proeminência da lavoura de soja, que se estabeleceu como o principal tipo de cultura na Amazônia. Ela responde por 74,4% de toda a área agrícola do bioma, totalizando 5,9 milhões de hectares em 2024. Além disso, os pesquisadores aprofundaram-se na evolução do cultivo de soja na região, especialmente sob a ótica da Moratória da Soja.
Esse acordo comercial, implementado em 2008, proíbe a compra de soja cultivada em áreas desmatadas no bioma após essa data. A maior parte da ocupação do solo pela soja na Amazônia ocorreu, surpreendentemente, após o limite imposto pelo acordo comercial, com 4,3 milhões de hectares passando a ser utilizados para essa cultura. Todavia, a análise revela que a maior parte desse crescimento, aproximadamente 3,8 milhões de hectares, ocorreu sobre áreas já convertidas anteriormente para pastagem ou outras formas de agricultura.
Mesmo assim, entre 2008 e 2024, houve uma conversão direta de formação florestal para lavoura de soja em uma extensão de 769 mil hectares, o que ainda representa um desafio significativo para a preservação.
Impactos Climáticos e Hídricos: Uma Floresta Mais Seca
Essas atividades de ocupação do solo impactaram principalmente a floresta, que foi a vegetação mais suprimida. Ao longo de todo o período analisado, 49,1 milhões de hectares foram removidos, o que corresponde a quase 95% do total da vegetação nativa desmatada. Consequentemente, já é possível observar alguns dos impactos diretos dessa perda de cobertura florestal.
Conforme apontado por Bruno Ferreira, os “mapas de cobertura e uso da terra na Amazônia mostram que ela está mais seca”, com consequências visíveis nas áreas úmidas do bioma. De fato, a análise dos pesquisadores revela uma retração de 2,6 milhões de hectares das superfícies cobertas de água na Amazônia entre 1985 e 2024. Isso significa que florestas e campos alagáveis, apicuns e mangues estão mais secos, com uma intensificação notável na última década. Nesse período, registraram-se oito dos dez anos mais secos para o bioma.
Esperança na Regeneração e Medidas Governamentais
Apesar do cenário preocupante, há um vislumbre de esperança na capacidade de regeneração da floresta. Em 2024, 2% do remanescente de cobertura verde da Amazônia era composto por vegetação secundária, equivalente a 6,9 milhões de hectares. Essas são áreas que foram convertidas anteriormente, mas não voltaram a ser desmatadas e, felizmente, iniciaram um processo de regeneração. Esse tipo de vegetação foi menos afetado pelo desmatamento no último ano, com 12% da supressão ocorrendo em áreas em regeneração, enquanto 88% atingiram a vegetação primária.
Esforços para Frear o Desmatamento
Diante desse quadro, o Ministério do Meio Ambiente afirma que o governo federal tem implementado uma série de medidas estratégicas para reduzir o desmatamento na Amazônia e em outros biomas. Uma das ações notáveis é a criação da Comissão Interministerial de Prevenção e Controle do Desmatamento (CIPPCD) em 2024. Essa comissão reúne 19 ministérios em uma iniciativa integrada, visando coordenar a fiscalização e a execução de políticas de preservação.
Além disso, o Sistema de Detecção de Desmatamento em Tempo Real (Deter), operado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), monitora a região em tempo real. Este sistema, portanto, pode ter contribuído para uma redução de até 45,7% nos alertas de desmatamento entre 2023 e 2024. Subsequentemente, com o apoio do reativado Fundo Amazônia, o governo retomou o financiamento de projetos estaduais e municipais que promovem a preservação e alternativas sustentáveis.
As operações de fiscalização foram intensificadas, com novos recursos destinados à aquisição de drones e helicópteros. Adicionalmente, um investimento de R$ 318,5 milhões em 2024 fortaleceu a presença de forças de segurança na Amazônia. O objetivo final do governo é zerar o desmatamento ilegal até 2030, através de metas claras para reduzir as taxas de destruição da floresta. Entre os principais desafios, destacam-se o combate ao avanço das fronteiras agrícolas e, igualmente importante, a repressão ao garimpo ilegal.