O ex-vice-presidente dos Estados Unidos, Al Gore, e proeminente ativista ambiental, manifestou-se criticamente sobre a abordagem do seu país em relação à crise climática, qualificando-a como “esquizofrênica”. Direto do Rio de Janeiro, onde participa de um evento global, Gore destacou a preocupante inconstância das políticas climáticas americanas, que flutuam drasticamente conforme a troca de presidentes na Casa Branca.
A Flutuação da Política Climática Americana
A inconsistência observada na política ambiental dos Estados Unidos tem sido uma fonte de preocupação global. Por exemplo, durante seu primeiro mandato, entre 2017 e 2020, Donald Trump retirou os EUA do Acordo de Paris, um pacto internacional crucial que visa limitar o aquecimento global a 1,5°C. No entanto, com a eleição subsequente de Joe Biden, o país reassumiu seu compromisso com o acordo.
Posteriormente, uma nova reviravolta ocorreu quando o segundo mandato de Trump, iniciado em janeiro deste ano, sinalizou uma provável nova saída. Segundo Al Gore, essa alternância entre administrações democratas e republicanas na abordagem da crise climática é lamentável e está muito aquém do ideal. Ele frisou que, no período pós-Segunda Guerra Mundial, o papel de liderança responsável assumido pelos EUA para a comunidade mundial torna essa situação ainda mais decepcionante. Embora a União Europeia tenha demonstrado um crescente potencial de liderança, Al Gore enfatizou que seria significativamente mais benéfico se os Estados Unidos restabelecessem seu compromisso com os valores humanos e permanecessem no caminho certo da ação climática. Essas declarações foram feitas ao final de um dia de atividades do The Climate Reality Project, um evento dedicado à mobilização política para ações climáticas, que acontece no Rio de Janeiro até o domingo seguinte.
Perspectivas para a COP30 em Belém
Em outra crítica direcionada à administração atual dos Estados Unidos, o democrata Al Gore abordou a 30ª Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30), agendada para novembro em Belém. Ele expressou ceticismo de que a ofensiva comercial e política de Donald Trump contra o Brasil possa, de fato, prejudicar a participação de governos subnacionais, sejam estaduais ou municipais, dos Estados Unidos no evento.
Além disso, Al Gore não hesitou em desmascarar o que ele descreveu como “mentiras descaradas” proferidas por Trump. Ele considerou profundamente ofensivo que o ex-presidente alegue um grande déficit comercial dos EUA com o Brasil, quando, na realidade, existe um substancial superávit americano. O ativista também citou outras afirmações inverídicas de Trump, como a de que a Ucrânia iniciou a guerra com a Rússia, ou que o carvão é uma fonte de energia limpa, e que moinhos de vento causam câncer. Para Gore, a reiteração de que Trump é um homem honesto, diante de tais declarações, é igualmente uma falsidade.
Capitalismo e a Transição Energética
Durante o evento no Rio de Janeiro, uma parte central das discussões sobre a redução de emissões de gases de efeito estufa girou em torno da disposição dos países em reestruturar seus modelos econômicos. Temas como a transição energética, a substituição dos combustíveis fósseis, a construção de modelos de desenvolvimento sustentável e o financiamento climático foram amplamente debatidos. Al Gore foi questionado sobre a viabilidade de uma redução genuína de poluentes sem uma transformação estrutural nas formas de produção e consumo, ou seja, sem um repensar do próprio sistema capitalista.
Al Gore defendeu que o capitalismo pode ser uma parte integrante da solução, em vez de um elemento central do problema. Ele citou dados otimistas, revelando que 93% de toda a nova geração de eletricidade no ano passado provém de fontes renováveis. Mais notavelmente, 85% do financiamento para esse desenvolvimento veio de fontes privadas de capital. Portanto, o ativista acredita que a transição energética mais ampla e sustentável é inevitável. No entanto, a questão mais grave, segundo ele, reside na capacidade de realizar essa transição a tempo. Ele lamentou que o presidente de seu país esteja tentando frear esse processo e que os poluidores de combustíveis fósseis empreguem todos os esforços para bloquear ações que contribuam para essa transição. Entretanto, Gore expressou otimismo, percebendo uma demanda crescente entre pessoas de diversas nações para efetivar essa mudança, o que, ele assegurou, é particularmente evidente no Brasil.
O Desafio da Poluição Plástica e a Hegemonia Fóssil
Recentemente, um encontro em Genebra, que reuniu 185 países para negociar um tratado sobre o combate à poluição por plásticos, terminou sem consenso na sexta-feira anterior (15). A poucos meses da COP30, o resultado levantou a questão se isso seria um indicativo das dificuldades que a conferência climática enfrentará. Al Gore considerou que o impasse demonstra o grau em que a indústria de combustíveis fósseis estabeleceu uma hegemonia global, exercendo um poder político significativo para ditar o que o mundo pode ou não fazer.
Adicionalmente, ele argumentou que o uso dessa rede de poder econômico para distorcer decisões políticas representa um verdadeiro desafio para a governança global nos dias atuais. Em seguida, Al Gore explicou o porquê de dedicar tanto tempo e esforço à construção de movimentos populares. Sua motivação é reafirmar a capacidade da humanidade de retomar o controle de seu próprio destino. Em conclusão, ele classificou como uma “loucura” permitir que os poluidores escrevam as regras e as leis, e ditem o que é permitido à população fazer, e o que eles não permitem.