A Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) informou, nesta sexta-feira (31), que não há indícios de crime no caso da idosa de 103 anos que teve parte do pé retirado por uma enfermeira, em casa e sem anestesia. A corporação, no entanto, investiga se houve infração administrativa por parte da profissional.
A informação foi divulgada em uma coletiva de imprensa, após semanas de apuração. Até então, a PCDF mantinha o caso sob sigilo. Segundo a delegada Ângela Maria dos Santos, a removação do tecido necrosado foi feita de forma controlada, e não se tratou de uma amputação completa.
Como ocorreu o procedimento?
O caso aconteceu em dezembro de 2024, quando a idosa foi submetida a três sessões de tratamento para uma ferida grave no pé, que acabou evoluindo para necrose.
A enfermeira, especializada em estomaterapia – área da enfermagem que trata feridas crônicas –, lavou o tecido, aplicou laser e realizou curativos. Na última sessão, no dia 13 de dezembro, os cinco dedos e parte da parte superior do pé se desprenderam espontaneamente.
Para retirar o tecido morto, a enfermeira utilizou um bisturi, técnica conhecida como desbridamento, que remove partes infeccionadas para estimular a cicatrização.
Segundo o perito médico-legista Otávio Castello, o procedimento não causou dor, pois a paciente, que tem Alzheimer avançado, não demonstrou sinais de desconforto durante a remoção.
“Essa paciente não fala, não abre os olhos e se comunica de maneira não-verbal. Não houve sinais de dor durante o procedimento”, afirmou o perito.
Por que não foi usada anestesia?
A ausência de anestesia foi um dos pontos mais polêmicos do caso. A PCDF explicou que, como a remoção do tecido foi resultado de um desprendimento natural, não havia expectativa de dor intensa.
No entanto, especialistas da Sociedade Brasileira de Angiologia e Cirurgia Vascular (SBACV) discordam. Segundo o presidente da entidade, Armando Lobato, mesmo em casos de amputação espontânea, a intervenção médica deve ser feita com anestesia adequada.
A PCDF reconhece a controvérsia, mas destaca que a família optou por cuidados paliativos ao invés de cirurgia, o que levou ao quadro de necrose avançada e, consequentemente, à separação dos tecidos mortos.
O que aconteceu depois?
A idosa passou mais de um mês com os cuidados domiciliares, mas, no dia 27 de janeiro, precisou ser internada para uma cirurgia de amputação na altura da coxa em um hospital particular.
Ela recebeu alta e se recupera em casa, no bairro Asa Norte, em Brasília.
O caso continua sob investigação pela Delegacia Especial de Repressão aos Crimes por Discriminação Racial, Religiosa ou contra Idosos e Pessoas com Deficiência (Decrin).
O que aconteceu com o membro retirado?
Outro detalhe que chamou atenção foi o destino do tecido removido. Segundo a PCDF, a enfermeira tentou descartá-lo no hospital onde trabalha, mas não conseguiu.
Trocas de mensagens mostram que ela informou à família e devolveu o material biológico, que foi descartado no lixo hospitalar da própria residência da idosa.
“Não se tratava de um pé inteiro, mas de fragmentos de tecido necrosado”, esclareceu o perito Otávio Castello.
Conclusão
A investigação descartou um crime, mas ainda apura se a enfermeira cometeu infração administrativa ao realizar o procedimento fora do ambiente hospitalar.
O caso reforça a importância do acompanhamento médico adequado, principalmente em pacientes idosos, e levanta debates sobre os limites da atuação de enfermeiros em tratamentos paliativos.